terça-feira, 22 de abril de 2008

Michael Moore alerta: a Saúde nos EUA agoniza


* Por Kelly Garcia

Confesso que o assunto escolhido me traz certa insegurança, porque não me sinto à vontade para escrever sobre filmes. Sou apenas uma pessoa sentada na poltrona e minhas percepções são bastante instintivas. Portanto já esclareço logo de início, para os amantes do cinema e profundos conhecedores, que não vou abordar aspectos técnicos do filme Sicko - $O$ Saúde, do diretor Michael Moore, que assisti nesse final de semana no Cinecultura. Tanto Fahrenheit 11 de Setembro como no Tiros em Columbine, que garantiram, pelo menos, no Brasil a notoriedade de Moore, colocam o diretor como crítico do governo americano, especialmente, do atual presidente, o Bush. Embora muitos atribuam a Moore uma postura política de “esquerda”, suas declarações e produções dão a ele uma característica apenas de “crítico” de determinadas ações políticas. Não havendo elementos mais consistentes que permitam afirmar que “ele é socialista”, ou “é de esquerda”. Com isso quero deixar claro que não vejo no diretor uma futura liderança socialista em solo americano. O seu limite é a crítica. Aliás, que deveria ser perfeitamente entendida numa sociedade que se intitula o exemplo de democracia para todas as nações. Marketing à parte... e lucro da indústria cinematográfica...o filme tomou para mim um caráter especial porque de certa forma deu conta de extrapolar um problema interno do “gigante”, e dar para a gente a rara oportunidade de ver, literalmente, uma ferida aberta na sociedade norte-americana, provocada pela privatização total do atendimento à saúde. E poder ver o resultado disso tudo nas suas vísceras, ficou ainda mais interessante, porque sabemos que as privatizações foram defendidas e impostas por influência do governo americano em vários países, especialmente na América Latina, que operou em nome da expansão do capital e garantia de lucros dos principais investidores mundiais. Saber que nos EUA tem gente vivendo em situação de miséria não foi novidade - conforme dados recentes, são 10 milhões de pessoas vivendo nessa condição. Agora tomar conhecimento que, mesmo a um cidadão americano que tem dinheiro e condições de pagar um seguro de saúde, lhe é negado atendimento pelas empresas que controlam o ramo, isso, sim, foi uma surpresa!! E me questionei onde está a força norte-americana de reagir contra a exploração? Onde está o heroísmo norte-americano de transformar a sociedade pela democracia? Onde estão os poderosos tribunais americanos? Moore mostrou para nós, expectadores, uma sociedade americana, vigorosamente, preparada para ser apática, que acabou ficando na história à mercê daquilo que, no passado foi tão bem incutido no comportamento coletivo, o fabuloso “American way of life”, e a idéia que todos poderiam assim viver, desde que, logicamente, se esforçassem individualmente.Ao assistir o filme do Moore, foi inevitável pensar no SUS, nossa política de universalização da saúde, e me lembrei de uma participação do João Pedro Stédile em um debate sobre políticas públicas, em que defendeu ferrenhamente o SUS, dizendo que na América do Sul poucos eram os países que davam conta de atender os casos de saúde, e o Brasil, com toda a dificuldade ainda tinha uma alternativa para dar ao pobre. Defendia um movimento nacional em prol da melhoria do atendimento da saúde pública e que essa luta deveria ser de todos. Entendo o SUS como uma política de redistribuição de renda, uma das formas onde todos contribuem para que todos possam ter acesso a um tratamento de saúde.Tenho consciência dos grandes problemas no atendimento, provocados principalmente pela falta de interesse das grandes corporações econômicas, para que uma política de saúde pública funcione bem. É bom não esquecer que saúde, nesse modo de produção, é uma mercadoria e muito cara.Assim, produções como SICKO, são daquelas raras oportunidades da gente, por meio da produção Hollywoodiana, se sentir motivado a debater um tema da magnitude da política de universalização da saúde. Valeu, sétima arte!




*Kelly Garcia é advogada, Mestre em Educação, militante de esquerda e, nas horas vagas, estilista da "Maria do Povo"

13 comentários:

Maria-Sem-Vergonha do Cerrado disse...

Kelly, tem um aspecto no seu post que considero muito importante: a defesa do SUS como um modelo. É verdade. O SUS é uma referência mundial e tem sido objeto de estudo por diversos países. Ao garantir a universalização do Sistema, a saúde é considerada como um direito de todos e deve ser assegurada pelo Estado brasileiro. Percebe a diferença radical entre o SUS e o sistema estadunidense, que privatizou o atendimento?
O problema no sistema está no subfinanciamento, nos desvios de verbas e na corrupção que, muitas vezes, acontece dentro dos hospitais e se alastra pelos órgãos gestores.
Quero muito assistir a Sicko. Ele, pelo seu relato, demonstra como o sistema capitalista transforma direito em mercadoria e, como mercadoria, o que importa é o dinheiro e não a vida. Enfim, a vida plena, em abundância, é incompatível com o capitalismo.

Unknown disse...

Ouvi dizer que o "sus" da itália tem um atendimento melhor que hospital particular do brasil. a cadeira de rodas vem na porta pra levar o paciente pra dentro.
pagamos umas das maiores cargas tributárias do mundo e não temos usufruto a nada - um direito à saúde, educação, segurança pra todos e não conseguem atender nem parcela da população.
ontem li q ocorreram 81 mortes provocadas possivelmente por um remédio contendo heparina contaminada proveniente da china. é a globalização. sei também que glicerina usada nos cremes dentais vindos da china também está contaminada e nem ao menos sabemos de onde vem a glicerina do creme dental que compramos. reparei também que a maioria dos produtos manufaturados que vamos comprar, tem um made in china. fora denúncias de tinta tóxica em brinquedos infantis... o tiro saiu pela culatra.

Maria-Sem-Vergonha do Cerrado disse...

Mi, as próprias entidades médicas consideram que o SUS é o mais bem concebido do mundo. Mas elas reconhecem que não funciona de maneira adequada. Para mim, isso é pouco. Muitas vezes, funciona mal mesmo, apesar de os números demonstrarem quantitativamente a abrangência extraordinária do sistema. Refiro-me à qualidade. E isso se deve pela falta de investimentos, recursos e problemas na gestão. Vejo que a saúde é um dos principais problemas no país, não por causa do sistema, mas por causa da gestão. Veja as filas nos postos de saúde, o problema da dengue, o caos em muitos hospitais. É neste aspecto que deveríamos exigir mudanças profundas: na efetividade do Sistema.
E é na sua efetividade que a nossa saúde padece. Li também que em Cuba o modelo de saúde é uma referência. Lá, parece que foram erradicadas as doenças tropicais, já, aqui, elas ressurgem com toda força. Lá também tem uma das menores taxas de mortalidade infantil de 6,5 por mil (de cada mil crianças nascidas vivas, 6,5 morrem antes de completar um ano); no Brasil esta cifra é de 29 por mil. A expectativa de vida é de 76 anos; no Brasil é de 68,7. Quem analisa a saúde cubana levanta duas questões. Uma é que existe pobreza, mas mas não miséria. Ninguém passa fome, todos têm casa, mesmo precária, todos são alfabetizados. Depois, há um sistema de saúde voltado para as necessidades básicas da população. Lá, os médicos atuam nas clínicas e fazem visitas familiares.Há um esforço na área de saúde preventiva. Acho isso necessário, uma vez que saúde não é apenas ausência de doença...é muito mais do que isso. Vou pesquisar mais sobre a saúde na Itália.

Unknown disse...

passei uns links sobre saúde na itália, mas acredito que os visitantes do blog que estão morando na europa possam tem uma visão mais real sobre o assunto, pelo menos no local onde vivem, não de maneira geral.
a gestão da saúde pública no brasil é fachada. os dados são deturpados (não teve epidemia de dengue aqui esse ano, porque não chegou o tipo 2, ainda...). a prevenção precisa ser planejada e executada por todos os meios possíveis.

e agora com a notícia do corte de verbas, espera-se que a eficiência compense uma verba menor que a prevista.

http://click.uol.com.br/?rf=hu-hn-man1&u=http://noticias.uol.com.br/ultnot/2008/04/23/ult23u1990.jhtm
*Com informações da Reuters
"... a Saúde sofreu um corte de R$ 2,594 bilhões na previsão orçamentária de 2008... de R$ 43,250 bilhões para R$ 40,656 bilhões...
O corte foi definido após o governo elevar em R$ 16,9 bilhões sua projeção de despesas para o ano, e aumentar a estimativa de receita em R$ 3,3 bilhões em relação à lei aprovada pelo Congresso.
Os ministérios da Defesa e da Educação aparecem em seguida com cortes de, respectivamente, R$ 1,906 bilhão e R$ 1,613 bilhão."

um problema no brasil diferente em relação a cuba talvez seja a extensão do país e número de habitantes.
falando em saúde, devemos lembrar da qualidade dos alimentos que comemos: agrotóxicos, anabolizantes, corantes, conservantes, transgênicos e nem sei mais o que estão acrescentando nos alimentos.

Unknown disse...

Eu também não sou uma profunda conhecedora de filmes, mas gostaria de assistir esse filme. Acho que o SUS é lindo na teoria.

Anônimo disse...

Roseane, vale a pena ver o filme, até porque ele acaba trazendo uma comparação de países "ricos" que possuem "saúde socializada", termo usado no roteiro.
e de quebra no final...vai até Cuba
...
Concordo com vc que o SUS, na prática, precisa de medidas urgentes para melhoria, que existem desvios de verba, e péssima gestão dos recursos públicos...mas tenho medo de pensar que pode chegar aqui !aqueles "governosloucos" propondo a privatização total do atendimento.
Todavia, reconheço que ...os problemas no atendimento cada vez levam mais e mais pessoas a buscarem os planos de saúde...e isso acaba também sendo positivo para a iniciativa privada.
nossa postura deveria ser outra...de certa forma agimos com a saúde tal qual com a educação...abandonamos as escolas públicas, deixamos de lutar por elas e matriculamos nossos filhos em instituições privadas...
...só que a conta dos procedimentos médicos (principalmente os mais complexos) é muito alta...ele é capaz de desestabilizar um família inteira.
Percebo na sociedade uma ausência das lutas coletivas em pról da saúde pública de qualidade. Talvez porque essa luta esteja essencialmente ligada com as aspectos individuais (estar ou não doente).
Esses dias escutei de um determinado político a seguinte frase:
"se tem problema no atendimento à saúde, porque então não vimos as pessoas pela ruas reclamendo. Se hoje não tem aqui pessoas reclamando é porque a população está satisfeita com o atendimento."
Eu quero ver a teoria do SUS avançar..foi sistema mutio bem elaborado.
O pai do meu namorado é paraguaio, lá não existe atendimento de saúde para os pobres, ele passou por um problema da saúde ...foi desesperador. Já a mãe dele é paraguaia, no entando possui nacionalidade brasileira (na fronteira isso é comum) fez uma ponte de safena, com cobertura total do SUS.
Se ha uma política que jamais deveremos deixar de lutar por ela é a saúde...ela tem que deixar de ser de "papel".

Unknown disse...

p/ complementar o que a kelly falou sobre "lutas coletivas", uma resposta do Stédile:

P. O senhor ambiciona ser, algum dia, presidente deste país?

Stédile: Não sei de onde vocês tiraram essa bobagem. O Brasil precisa que o povo se conscientize, organize e lute por seus direitos. Somente assim poderemos enfrentar os atuais problemas econômicos e sociais a fim de construirmos uma sociedade mais justa, com que todos sonhamos.

Maria-Sem-Vergonha do Cerrado disse...

Mi, você tem razão qdo diz que a saúde no Brasil é uma fachada, ou seja, no papel é uma coisa e na prática é outra. Mas vejo que a grande luta apontada por vc, pela Kelly e pelo Stédile deve ser para tirar do papel. Aos sanguesugas privatistas (planos de saúde, indústria farmacêutica, que se alimentam da doença, da dor e da morte das pessoas) não interessa o que está garantido no SUS enquanto sistema. Por isso, devemos lutar para que o modelo seja efetivado.
Esse assunto me comove muito. Meu pai teve câncer e foi tratado pelo SUS (cirurgia, quimio, radioterapia). Na época, sentimos na pele a importância de um sistema público porque não tínhamos convênio particular.

Anônimo disse...

michael moore, o "documentarista" mais manipulador e tendencioso que já apareceu. mas como ele vive de falar mal dos estados unidos tá valendo, né? para mostrar um verdadeiro modelo de sistema de saúde que funciona, ele poderia ter ido até um país escandinavo, mas acho que fazer propaganda de cuba causa mais impacto.

aliás, por que não se inspirar na suécia, onde o modelo de socialismo consegue conviver muito bem com capitalismo e o pensamento liberal?

em nome de um pensamento obsoleto e de mão única (para usar um eufemismo), o blog acaba fazendo a apologia do mau-caratismo. vamos brindar ao bandido do stedile, ao genocida do fidel. o que será de cuba agora que o povo pode comprar celular, esse instrumento de manipulação capitalista? aguardo ansiosamente um post sobre kim jong-il e o povo feliz da coréia do norte, que vive a vida plenamente. e sobre o post mais recente, concordo que toda a truculência na alemanha oriental era culpa do capitalismo. os habitantes do leste adoravam viver emoções fortes ao tentar pular o muro para viver naquela terra nojenta do outro lado.

vamos ler grandes pensadores como chomsky (que hoje em dia anda desacreditado até por intelectuais de esquerda), emir sader e bernardo kucinski, que foi aos EUA aprender como se faz propaganda do governo.

Anônimo disse...

caro e corajoso anônimo, se você olhar bem o texto verá que eu mesma fiz uma ressalva quanto ao Sr. Moore..disse que marketing e lucro da industria cinematográfica à parte (o sujeito ganhou um óscar, não sejamos ingênuos), o mérito do filme era provocar o debate sobre a política de universalização da saúde...e acho que isso é algo muito sério para a direita e para a esquerda ...ou será que todos da direita possuem dinheiro suficiente para pagar um tratamento particular de cancer? ou uma ponte de safena? já vi fazendeiros dos mais conservadores falirem pagando tratamento de saúde particular...Quanto ao filme acho que você não se lembrou das cenas que mostraram o sistema de saúde da França, do Canadá e da Inglaterra, ou você não assistiu!?? Deve ter assistido se não por que estaria fazendo comentários do que não conhece. Quanto ao stedele...ele defende um sistema de saúde universalizado...que eu também defendo. Meu caro e valente anônimo o que ganho paga as contas de água, luz, telefone, alimentos e uma ou outra coisinha ...um problema de saúde aqui é um rombo...portanto concordo com qualquer pessos, pode ser branca, negra, roxa, corintiana, palmeirense, de direita, de esquerda, os inteligentes, os imbecís, etc, que defenda a saúde pública, eu já vi o desespero de perto e sei o que é chorar por medo de não conseguir comprar remédios...lamento mas o que você pensa e fala, por tudo que já vivi, para mim é incoerente defender.

Unknown disse...

e o blog pega fogo. adoro labaredas. rsrs lembra o óvulo do dragão. e esqueci de pedir uma consultoria técnica pro augusto: se o óvulo estava fecundado ou não.
infelizmente, ou felizmente, não tenho tido muitas oportunidades pra ir ao cinema, ou locar filmes, por razões financeiras e de "tempo". dizem q a arte serve para "alimentar a alma", pode dar vazão aos nossos sentimentos (a gente paga pra chorar no filme). foi nietze quem disse que a arte deveria trazer a beleza e esperança?
bom, assim como raros filmes foram melhores que os livros que deram origem, os filmes são fantasiosos, mesmo os históricos que precisam passar um algo mais na tela do que realmente foi na verdade. então servem como referência pra levantar pontos do que acontece na vida real e provocar todo esse nosso debate. um filme que assisti e se consegue captar o que acontece com a nossa própria perceção, sem manipulações (talvez o único) chama-se Fala Tu. Ele não dá conclusões, só acompanha a vida de 4 pessoas aqui do Brasil, não usa e não precisa usar fundo musical pra mostrar ou acentuar a dramaticidade dos fatos. já pensou em tirar a trilha musical dos filmes? dá uma grande dierença.

ah. sobre o Stédile, foi pra mim. rsrs não conheço nem 1% do que é o Stédile, nem sei se é mau-caráter ou bandido. acho que não existe uma única personalidade perfeita no mundo. portanto, nunca brindaria ao stédile e a nenhum outro. assim como usamos algumas frases de personalidades que se encaixam no que queremos dizer, podemos aproveitar o que qualquer pessoa tem pra acrescentar, ou o que tem de "bom". concordo com a resposta dele que nós, o povo precisa se organizar. tenho até pensamentos anarquistas. rsrs

qto à crítica do pensamento obsoleto e de mão única do blog, é coisa que pode ser pensada. pode ser obsoleto sim, afinal tudo é muito dinâmico, mas não sei obsoleto em que sentido ainda. e o mão única, é um ponto de vista, mas que pode ser adicionado de ressalvas sempre que se mostrarem "verdades" diferentes.

Mas queremos sim, uma saúde pública de qualidade, educação, segurança... tudo que temos direito pelo tanto que contribuímos. mas não adianta querer, precisa gritar bem alto e juntos pra conseguir alguma coisa. e aqui no blog estamos juntando nossos gritos. se um "mediador de mídias sociais" (li ontem sobre uma nova profissão) fizesse uma pesquisa sobre o que pensam da saúde pública, ia dar 100% de reclamação. mas como nunca faz diferença na hora do voto, nenhum governo se preocupa.
como disseram uma vez pra mim, somos uma sociedade bovina, o gado fica todo junto, mas alheios uns aos outros, e se fossem coletivos e soubessem a força que tem, não seriam abatidos um a um. rsrs

Unknown disse...

miti estou virando fã de sua sabedoria oriental...

Maria-Sem-Vergonha do Cerrado disse...

Depois do comentário da Miti, não preciso dizer mais nada...Aliás, a Miti e a kelly estão de parabéns pela movimentação do coreto virtual...cada dia aprendo mais com vcs e a cada dia admiro mais vcs...só sinto não ter visto o filme que saiu de cartaz...ainda não consigo conciliar a agenda de trabalhadora, mãe, mulher, cidadã, blogueira e ser que precisa ir ao cinema, encontrar os amigos, tomar café na padaria com um bom bate-papo, ler livros, ler jornais, revistas...e ainda malhar para manter a mente sã e o corpo são (um pouquinho, né)