quarta-feira, 30 de abril de 2008

Calendário do Poder - É isso aí

Tela Brasil, Siron Franco
Centenas de livros interessantes na minha frente e eu só podia escolher um para dar de presente de aniversário a um amigo muito especial. Senti bater aquele impulso consumista. E ele veio forte: todos os poemas do Machado do Assis. Contos da Virgínia Woolf. Obras Completas de Jorge Luís Borges. Resisti...resisti...resisti e acabei comprando apenas Calendário do Poder, do frei Betto. E o que me ajudou a decidir pelo livro foi uma pequena passagem que li ao saborear aquela breve folheada que a gente dá nas livrarias. Betto diz que a política é demasiadamente importante para ficar apenas em mãos de políticos profissionais e se apequenar em conchavos partidários, vaidades eleitoreiras, alianças espúrias. “Ela (a política) que decide os rumos da humanidade em direção à barbárie ou ao patamar da civilização do amor”. Considero frei Betto um poeta, um profeta, assim como Leonardo Boff. Lamento que não sejam eles, esses poetas e profetas, a dirigir os processos políticos, a ouvir nossos clamores, a assinar as demarcações das terras indígenas, os atos de reforma agrária, de destinação de recursos para a saúde, educação, assistência social, agricultura familiar, pesquisas científicas, reforma política, reforma tributária. Política deveria ser feita com amor, com um amor incondicional pelos seres humanos e pelo meio ambiente. E o amor é o contrário da morte, é a antítese da prisão, do egoísmo, da ganância, da exploração, da injustiça, da discriminação. Como diz Ruben Alves, o amor deixa o outro voar, acrescento: voar para a felicidade. Mas nos bastidores da política tem imperado o ódio, o alimento da mesquinhez que tritura sonhos, tritura gente, aniquila a solidariedade, o coletivo. E isso não é uma prática que impera apenas na direita, ela está viva em setores da esquerda, daqueles que enchiam a boca para anunciar mudanças e transformações. Antes que a resignação me domine, escuto É isso aí, com Seu Jorge e Ana Carolina. Escuto e me inclino a acreditar no amor...então, penso nos meus filhos, penso nos meus amigos, penso naqueles que se foram e deram a vida por uma utopia...aí o meu coração dispara de amor.

É isso aí - the Blower's Daughter

É isso aí
Como a gente achou que ia ser
A vida tão simples é boa
Quase sempre
É isso aí
Os passos vão pelas ruas
Ninguém reparou na lua
A vida sempre continua
Eu não sei parar de te olhar
Eu não sei parar de te olhar
Não vou parar de te olhar
Eu não me canso de olhar
Não sei parar
De te olhar
É isso aí
Há quem acredite em milagres
Há quem cometa maldades
Há quem não saiba dizer a verdade
É isso aí
Um vendedor de flores
Ensinar seus filhos a escolher seus amores
Eu não sei parar de te olhar
Não sei parar de te olhar
Não vou parar de te olhar
Eu não me canso de olhar
Não vou parar de te olhar


Uma crônica de amor - Zé Lelé e a paixão. A paixão e o Zé Lelé

Obra "O Abandono" (1905)
Camille Claudel
*Por Edson José de Moares

Bom mesmo é ficar quietinho e esperar o amor passar. Brincadeira boba - assisti na televisão que os índios acham que suas almas são roubadas pelo beijo na boca. Lembrei trecho da música "a televisão me deixou burro, muito burro, demais". Te liguei só por que deu vontade, nem tinha assunto nem propósito, isso é um bom sinal.Vontade de se comunicar. Para mim que vejo o tempo com cara de quem está indo, sem pressa, mas sem esperar, acredito que melhor dele é mesmo quando passa rápido. Nem era agorinha e já é tão tarde. Hoje já é terça-feira, dia de ligar para você de novo, essa agora, os dias passam e essa vontade fica. A vontade de ter uma boa risada, diante da pior das piadas, não pode ser coisa normal. Houve alteração na capacidade de rir sem risco de ser confundido com Zé Lelé, e, isso me deixou mal.Essa coisa de conversar sobre quem nos interessa seria tão normal, ? Mas há um bicho que chacoalha a moita da estupidez, das razões e das opiniões. A gente nem sabe o tamanho do bicho. A passarela é estreita e há sombras que causam medo, e, a moita ao lado da passagem balança, ameaçando sair dela feras ou assombrações. Paro. Suspiro, e ainda não encontrei a coragem para enfrentá-la, meu medo é que só exista esse trieiro, bom, até ver a moita eu tava rindo de Zé Lelé. Agora meu medo é, se esse riso seja coisa de gente feliz, que ouve música e ri sozinho, feliz de estar perto de quem faz rir, naturalmente. Se essa hipótese tiver algum fundamento, as mulheres dos palhaços são as mais felizes do mundo. Eu não conversei com ninguém sobre nós, essas coisas que juntam as cordas "nós" e, ao que me lembre nunca falei de nenhuma paquera, não havia passado, sempre teve um depois de se ver, de se falar, e, ficar. Mas contigo, foi diferente, sua popularidade me carregou pelas opiniões que nunca imaginei, queria sair carregando a mais preciosa carga do mundo, sem ninguém saber o segredo da minha alegria, isso me declarou, não contive o desconforto, foi isso que mais me incomodou. Tenho certeza, sempre que opiniões são dadas sobre as impressões por e de outras pessoas, passam por um filtro, mas não deveriam ser escrito, senão em biografias pós-vida, aí incomodaria o defunto e só. Mas, de longe a nossa breve história saltou em todas as conversas. A começar, pelo menos entre os meus dois amigos, que quase nunca os vejo, com uma rapidez de clique na tomada até acender a luz, e com uma baita amplidão de sol em dia de tempestade, até desconhecidos deixarem recados na porta, uns felicitando, outros não acreditando que fosse possível. Esses últimos, como os primeiros não sabem nem os nomes, mas dão a impressão de conhecer profundamente os "namorados". Falsos testemunhos de que sou chatinho, cabeça dura e, pior, que estou sem eira nem beira, abalaram profundamente a minha fé na humanidade e não sei se serei mais capaz de me reconhecer nos espelhos dos vidros dos automóveis, onde sempre me penteava. De resto, sei que sou forte e corajoso, se não fosse essas duas virtudes você jamais leria esse desabafo heheh.A realidade é uma novidade anunciada em todos os momentos que a gente põe a mão no bolso. A verdade é uma senhora cheia de histórias, e gentilíssima, ela sempre tem um jeito de contar para cada ouvinte, conforme sua simpatia. Claro, ela apesar de gentil, pode mesmo ser muito severa, às vezes ignorante e mesmo, cruel. De resto aqui do alto da montanha vou vendo as nuvens e as luzinhas da cidade, sabe como é, resolvi dar uma voltinha pelos céus da cidade para parar de pensar em você e achar um ovo de páscoa pra entregar para quem eu gosto. De quem nunca foi Zé Lelé. E descobriu gente feliz e boazinha e sem medo de tudo que se esconde. Amoitam-se maldizeres sempre que viam namorados, no nosso caso chacoalharam o pé-de-encantamento, movem pra lá e pra cá, sem o devido cuidado com a plantinha, que nem desconfia que ela não nasce em pedras.

* Edson José de Moraes, é designer, ilustrador, poeta, animador cultural e militante

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Blogagem Coletiva - Dia de Poesia

Foto: Elis Regina Nogueira - Livro Outros Sentidos, de Victor Barone

Hoje, vários blogs no mundo, postaram poesias - alimento necessário para a alma. Pensei em vários poetas e decidi postar mais um poema do Victor Barone, que estará lançando o seu primeiro livro, Outros Sentidos, no próximo dia 05 de junho, Dia do Meio Ambiente, um dia simbólico e que tem tudo a ver com poesia, com verso - esse elo fundamental para integrar o homem e a mulher ao cosmo, ao ethos, à sua morada, à grande casa que é o planeta. O local do lançamento será o Museu de Arte Contemporânea, outro espaço simbólico: museu guarda viva a memória humana, o nosso traço na história, o verbo anunciado, rasgado, registrado...tudo vai acontecer numa noite também simbólica, dia de lua cheia, iluminada, grávida de amor, de palavras doces, amargas, ácidas, expressadas assim como são os versos criativos de Victor.

O outro poema que posto é de Maria Tereza Horta, poeta portuguesa, uma descoberta recente, que me envolve com a sensualidade do sensível, do tácito, do real, do imaginário. Agora, falta você postar o seu poema, deixando os nossos encontros no coreto virtual com ar de recital.


Victor Barone
Os olhos vazios de você
observam meu peito repleto de nada.
E como faca
esta saudade desliza em mim.
Abrindo na pele um livro de sangue.
Meus lábios sedentos de você
observam este mar
que meus olhos encharca.
E como seta
esta ausência se crava em mim.
A lembrar que não há rima
que cure esta falta.


Maria Tereza Horta
Desperta-me de noite

O teu desejo

Na vaga dos teus dedos

Com que vergas

O sono em que me deito

É rede a tua língua

Em sua teia

É vício as palavras

Com que falas

A trégua

A entrega

O disfarce

E lembras os meus ombros

Docemente

Na dobra do lençol que desfazes

Desperta-me de noite

Com o teu corpo

Tiras-me do sono

Onde resvalo

E eu pouco a pouco

Vou repelindo a noite

E tu dentro de mim

Vais descobrindo

Revista Fórum: vale a pena ler

Nesses tempos de pensamento único e ditadura do consenso na grande mídia, vale a pena mesmo buscar as leituras alternativas. Além da Caros Amigos, do Jornal Brasil de Fato, uma revista muito interessante que circula mensalmente é a FORUM. Na última edição, ela entrevista o jornalista Paulo Henrique Amorim, que foi demitido recentemente do Portal IG. Paulo Henrique diz que a BrOi e Daniel Dantas são os responsáveis pela sua demissão, faz uma análise da imprensa, da política nacional e das privatizações e afirma: compra da Brasil Telecom pela Oi será a “grande conciliação nacional” envolvendo PT e PSDB. Não concordo com vários pontos de vistas de Amorim, mas não tenho dúvida de que informações importantes da relação promíscua do poder do capital e do poder palaciano com a mídia são reveladas. A exemplo do que fez a Kelly sobre o Michael Moore, também, acho oportuno esclarecer: Paulo Henrique não é socialista e nem de esquerda. Leia abaixo um trecho da entrevista.

Paulo Henrique Amorim denuncia: a BrOi e Daniel Dantas me demitiram
Por Renato Rovai e Glauco Faria


Fórum – Quando o senhor identifica o início da degradação da imprensa brasileira?
Paulo Henrique Amorim – Chegamos a um ponto sem precedentes em termos de degradação e corrupção da imprensa brasileira. A imprensa que chamo de Partido da Imprensa Golpista, ou PIG, é, sobretudo, a Globo, a Folha e o Estadão. Não falo da Veja, porque é um caso especial que eu chamo de “a última Flor do Fascio”, nem da IstoÉ, porque não é uma organização jornalística. Quando você compra um jornal, teoricamente, pelos cânones da indústria, vai obter ali um noticiário razoavelmente isento e, nas páginas de opinião, fica aquilo que o dono quer divulgar. Aqui no Brasil, houve uma inversão completa. Hoje, tem opinião na parte informativa, até no horóscopo e na previsão do tempo, e o mais grave de tudo isso é que se disseminou o sistema de cooptação com dinheiro do jornalismo econômico e político. Tenho divulgado no meu site as relações entre o Daniel Dantas e algumas instituições, cuja função é distribuir notícias que influenciam formadores de opinião, a Justiça... É uma degradação sem precedentes. Meu ex-colega do IG, Luís Nassif, tem feito um trabalho exemplar ao apontar as ligações sórdidas entre a Veja e interesses econômicos constituídos. Não há nenhuma punição, nenhuma reclamação, nenhuma manifestação de indignação, os jornais do PIG não noticiam o que o Nassif está dizendo. É a maior revista semanal do país e ignoram o que fala um jornalista respeitável que trabalhou na Folha durante uma década, do Conselho Editorial da Folha. Ou seja, Nassif não é irresponsável segundo a Folha. E a Folha não dá uma linha! O Mino Carta, que é o pioneiro nessa batalha para demonstrar a pusilanimidade, o golpismo e agora a corrupção na imprensa, acha que nós não chegamos no fundo do poço, que ainda iremos mais fundo e saberemos mais coisas e a impunidade continuará.

Fórum – O senhor acredita que essa degradação se agravou durante o processo de privatização?
Amorim – O presidente do México, Carlos Salina de Gortari, vendeu a telefonia do México para uma pessoa, que é o Carlos Slim, hoje o homem mais rico do mundo. Salinas de Gortari teve que fugir do México para a Irlanda porque nem em Miami ele podia ficar. O Fujimori, que fez a privatização no Peru, está preso. O Carlos Menem, que fez a privatização na Argentina, tem vários ministros na cadeia e não pode ver um juiz ou policial que sai correndo, pode ser preso a qualquer momento. Aqui no Brasil o Fernando Henrique Cardoso cobra US$ 60 mil por palestra e sai no PIG toda hora. E as pessoas levam o Fernando Henrique a sério, é o herói de uma parcela da população brasileira. Vou desenvolver essa tese com mais clareza, mas houve, na transição do regime militar para o democrático, a tragédia da dívida nos anos 80. O Brasil quebrou em 1982, o fenômeno da hiperinflação, e o Sarney tentou resolver, o Collor tentou resolver, e o Fernando Henrique tocou o Plano Real. O plano, entretanto, tinha, como base para solucionar ou para auxiliar a equacionar o problema, a privatização, um instrumento pelo qual o sistema político dominante à época – o PSDB e o PFL – encontrou para acomodar os interesses políticos internos, domésticos, da coalizão dominante e os interesses dos bancos. Ela foi o fiel da balança dessa reengenharia que levou ao sucesso o Plano Real. Agora, temo que a operação de criação da BrOi seja a consubstanciação, aquele quadro do Napoleão sendo coroado, que está na igreja de Notre Dame. O quadro começa a ser pintado a partir do momento em que o Luciano Coutinho, presidente do BNDES, assina o empréstimo para o Carlos Jereissati e o Sérgio Andrade comprarem a Brasil Telecom, sem botar um tostão. Nesse momento, será feita a grande conciliação nacional, os fundos e o Citibank renunciam a toda ação [judicial] que moveram na Justiça contra o Daniel Dantas. O governo Lula põe para dentro a corrupção do Dantas e do governo FHC, limpa a pedra e resolve esse problema botando o dinheiro do BNDES nas mãos desses dois subempresários, já que eles compraram a Telemar sem gastar também. Aí será feita a grande pacificação nacional, que mobilizou essa subimprensa de contratos de prestação de serviços, mas que você nunca sabe que serviços são esses. Então, se houver o Aécio [Neves] candidato em uma chapa que reúna PSDB e PT, como está sendo montada em Belo Horizonte, resolve tudo. Põe todo o Brasil debaixo do tapete. O PSDB esconde ossos do Fernando Henrique no armário do Lula, o Lula esconde no armário seus próprios esqueletos, e o Brasil vai seguir em frente com a conciliação que o Tancredo [Neves] tentou fazer e não conseguiu porque morreu antes. A privatização é o que define o processo da Nova República no regime pós-militar, é a metástase da corrupção no Brasil. O Daniel Dantas é o maior símbolo, herói e beneficiário desse processo que corrompeu o PSDB, o PFL e o PT. Ele corrompeu o PSDB, financiou a filha do Serra e ele é a grana que está no duto do Valerioduto. Que o procurador-geral da República não procurou e que o ministro Joaquim Barbosa não achou. A grana do Valerioduto veio de onde? Dá em árvore ou o Valério era maluco e colocava dinheiro dele no esquema? Ele era um lavador de dinheiro e ninguém quer dizer isso. Fizeram a CPI dos Correios e não pediram indiciamento do Daniel Dantas, porque a bancada dele tem um líder no senado, que é o Heráclito Fortes, e tem um líder na Câmara, que é o José Eduardo Cardozo.


Fórum – Então a tentativa do PT de incluir o Daniel Dantas na CPI dos Correios foi uma farsa?
Amorim – Foi uma tentativa de última hora, feita depois que o relatório estava escrito e que não resultou em nada. Durante a argüição do Daniel Dantas, o senhor José Eduardo Cardozo fez perguntas que o Dantas esperava que fossem feitas e o Jorge Bittar (PT-RJ) fez perguntas inúteis. Ninguém do PT perguntou se o Dantas colocava dinheiro no Valerioduto. E era a única pergunta que cabia ali. Por que o PT não foi pra cima do Dantas? Porque o cara da bancada do PT não sabe se quem está do lado dele pegou dinheiro do Dantas. O Dantas calou o PT, o Dantas imobilizou o PT, porque o Dantas comprou uma parte do PT. Pode escrever aí.

Fórum – No PT, havia uma disputa que envolvia o Luís Gushiken, os fundos e a participação do Dantas...
Amorim – O Gushiken pagou o preço de ter tirado o Dantas da Brasil Telecom. E outro que pagou o preço foi Paulo Lacerda, homem probo e policial eficiente. Foi tirado da Polícia Federal porque queria prender o Daniel Dantas.

Fórum – O senhor já conversou sobre isso com o Paulo Lacerda?
Amorim Não posso revelar.

Fórum – Bom, a respeito da sua demissão do IG...
Amorim – Tenho minha coleção de demissões, mas vamos lá. Ali é um processo de “água mole em pedra dura tanto bate até que fura”. O Sr. K [o presidente da Brasil Telecom, Ricardo Knoepfelmacher], como mostro no meu blogue, a letra “K” aponta para direções opostas e esse é seu grande enigma: para que direção o Sr. K aponta? Ele entrou como presidente da Brasil Telecom como representante dos fundos e do Citi para desfazer as falcatruas do Dantas. Ele me contratou porque eu tinha uma história na internet de combater o Dantas. Isso ele me disse. E por que de repente isso mudou? Essa é a pergunta-chave da história. O Sr. K recebia pressões de diversas áreas, do José Serra, que tem uma tradição de pedir a cabeça de repórteres; do Carlos Jereissati e do Sérgio Andrade; e do Citibank. Porque eu, com o Rubens Glasberg e o Mino Carta fomos os únicos jornalistas que perguntaram: vale a pena fazer a BrOi e passar uma borracha no passado do Dantas? É esse o custo de fazer a BrOi?. Quanto dinheiro do senhor Jereissati e Andrade vai entrar nisso? Entrei com um documento, quero a BrOi, e dou um real a mais do que os dois colocarem do próprio bolso. No meio do ano passado, o Sr. K tentou montar um conselho editorial para cercear minha opinião. Eu não posso revelar quem eram as pessoas que compunham o conselho, mas digo que eram pessoas que tinham por mim o mesmo apreço que tenho por elas. Consegui impedir que isso acontecesse. E me pergunto para que, já que 95% do conteúdo de um portal é de terceiros? Depois veio uma tentativa de me tirar da capa do IG. Levei seis meses negociando com o Sr. K esse ponto: só vou para o IG se tiver espaço na capa. Sabia, porque no UOL já tinham me feito isso. E ele precisou de seis meses para impor a vontade dele e me colocar na capa. Depois, ele quis me tirar da capa. Foi uma batalha em que o Caio T – de Tartufo – Costa desempenhou um papel nobre e edificante. E eu ganhei. Finalmente, estávamos na antevéspera da solução do problema da BrOi, na antevéspera da Semana Santa, e ele me tirou do ar. Agora, ele me tirou do ar com uma tecnologia que o Caio T – de Tartufo – Costa conhece muito bem, que é tirar do ar fisicamente. Ele me tirou do ar antes que pudesse ser notificado, estava no segundo bloco de um programa que gravo na Record e a minha equipe já tinha sido escorraçada do IG, os computadores lacrados, os crachás retirados. O Caio retirou meu trabalho de dois anos no ar. Ele apagou o meu passado. Ele fez uma limpeza ideológica. Por que ele não me avisou e não redirecionou o internauta para o novo endereço? Como a Globo fez com o Franklin Martins, ela não o queria mais, mas redirecionou [o internauta para o endereço novo]. Por que [ele] quis me apagar?


Fórum – Você disse que o Caio Túlio Costa já teria feito coisa semelhante.
Amorim – Estou precisando comprovar casos específicos, mas ele fez comigo no UOL. Uma série de informações que eu dava sobre as relações amistosas e dignificantes entre duas grandes personalidades brasileiras, José Serra e Nizan Guanaes. Não há registro físico, é uma especialidade dele suprimir isso. E olha que dá aula na Cásper Líbero sobre Jornalismo e Ética... Mas ele é um pau mandado, executa com entusiasmo o que o patrão mandou fazer. O Sr. K também serve a vários patrões. Fui demitido porque escrevia contra a BrOi e Daniel Dantas.


Fórum – Seu trabalho na televisão é bem diferente da internet. Por quê?
Amorim – Na televisão, não trato desses assuntos. A internet tem uma vantagem, você pode fazer o que quiser. É o último reduto da liberdade de imprensa e, felizmente, aqui no Brasil, está nascendo algo similar ao que já existe nos Estados Unidos. A blogosfera está se transformando em um espaço de debate político relevante. Não estou mais interessado em discutir política, economia, essas coisas mais sensíveis na televisão. A televisão brasileira não é o espaço mais apropriado para isso e quando se faz, se faz mal feito. É a Miriam Leitão, William Waack, Arnaldo Jabor, Alexandre Garcia, esses grandes jornalistas que fazem a televisão brasileira. Então, não quero mais tratar disso na televisão. Ali, faço parte do Domingo Espetacular e sou repórter, como fui no Fantástico por seis anos em Nova Iorque, de onde fazia matérias que não tinham nada a ver com política. Cobria incêndio, crime, enchente, guerra civil... Sou repórter, porque esse pessoal que está aí, Reinaldo Azevedo, Diogo Mainardi, que acham que são jornalistas, não sabem cobrir uma batida de trânsito na esquina. Se mandar cobrir, chegam na redação com informações inverídicas e incompletas. Por isso não trato com esses camaradas, eles não são da minha profissão. Eles vendem a opinião deles. E não troco minha opinião por nada. Agora não quero saber de portais que só reescrevem o que sai na Agência Estado, Folha e Globo – uma reprodução mal feita.

Fórum – É impossível discutir política e economia na TV? Quando o senhor fazia o Tudo a Ver dava, ao menos, alguns pitacos sobre esses temas.
Amorim – Era muito limitado e foi ficando cada vez mais. Trabalhei na Globo em um período que tinha hiperinflação e chegaram à conclusão de que era necessário ter jornalistas de economia na televisão. E o Delfim Netto diz, com muita propriedade, que no Brasil jornalista de economia não é uma coisa nem outra. Hoje, na Globo acontece o seguinte: o Roberto Marinho morreu e foi substituído por três filhos que não têm curso universitário. Nenhum deles é conhecido pelo nome próprio, são filhos do Roberto Marinho. Colecionam fracassos empresariais. O mais velho, Roberto Irineu, é responsável pelo “grande sucesso” da Tele Montecarlo. Os três, por omissão/incompetência, delegaram o comando das suas redações a alguns prepostos, entre os quais se destaca o Ali Kamel [diretor-executivo da Globo], que escreveu um livro para mostrar que o Brasil não é racista e revelou o Brasil racista. E eles escrevem o que imaginam que o patrão vá gostar de ver. Mas isso tudo carece de um mínimo de sutileza, de argúcia, que o velho tinha. O velho, dificilmente, na base de operações que é o Rio de Janeiro, brigaria com o presidente, com o governador e com o prefeito. Desconfio que o outro Roberto não faria isso, se ele e Antonio Carlos Magalhães estivessem vivos, estariam trabalhando com o Lula. Estariam trabalhando na base do governo, na sombra. Não é muito bom estar brigado com o governo federal por muito tempo.


Fórum – Mas se o presidente Lula está fazendo essa conciliação, por que o PIG quer derrubá-lo?
Amorim – Porque ele é pobre e nordestino, é uma combinação de preconceito de raça com preconceito de classe.


Fórum – A possibilidade de aliança PT-PSDB em Belo Horizonte é resultado dessa conciliação?
Amorim – É o resultado físico da conciliação. Com esse mesmo espírito de concertação que uma candidatura Aécio com apoio do PT é um velho sonho da elite brasileira, da qual o Lula quer fazer parte, que é o Pacto de Moncloa eterno. Nós não somos a Argentina e lamento profundamente. Gostaria de ser argentino para ser militante peronista. O presidente Néstor Kirchner desfez o Supremo Tribunal e o presidente Lula nomeou para o STF um xiita católico que se posiciona contra as pesquisas com células-tronco. Esse Carlos Alberto Direito, que conheço desde que éramos estudantes da PUC, disse antes que era contra a pesquisa com células-tronco. Tem que tirar o Marco Aurélio de Mello de lá. Ele é um golpista, despreparado, não passa nem em prova de juiz de primeira instância. Eu tenho a tese: o que o PT de São Paulo mais quer é ser tucano de São Paulo. E acho que uma das grandes coisas que pode acontecer com um grande acordo entre Aécio e o PT é tirar São Paulo do centro. Chega de São Paulo! O Brasil é muito maior que São Paulo.

Fórum – O senhor aponta as contradições do governo Lula, mas também se posiciona como resistência antigolpista.
Amorim – Veja bem, acho Lula melhor do que o Fernando Henrique. Acho os tucanos um conjunto de tartufos, são administradores incompetentes, FHC quebrou o Brasil três vezes. Governam São Paulo há 13 anos, metrô cai, o viaduto cai, você demora uma hora e meia para chegar no trabalho. Dê um exemplo do que os tucanos fizeram aqui? São incompetentes, ineptos. Sou contra os tucanos. Tenho uma identificação político-ideológica, sou carioca, minha simpatia fica com Leonel Brizola, que dizia que o PT era a UDN de tamancas, o Darcy Ribeiro dizia que o PT era a esquerda que a direita quer... Gosto do Jango [João Goulart], do [Getúlio] Vargas e acho que o PT cometeu um grande erro quando achou que a direita ia vê-lo sob outra perspectiva. A direita os vê da mesma forma que via o Brizola, o Jango e o Vargas, porque o PT é trabalhista como eles. O Lula achou que ia encantar o PIG, a família Marinho e, como dizia o doutor Tancredo, “você vende a mãe mas não vende seus interesses”. O Lula não caiu porque o Fernando Henrique não deixou. Naquele momento em que o Duda Mendonça confessou que recebia dinheiro do exterior na CPI, se sobe um deputado na mesa da Câmara e na presidência da Casa está o Auro de Moura Andrade , o Lula caía. Por que o Lula não caiu? Porque o Fernando Henrique defendeu a tese do sangramento. E o Agripino Maia comprou e convenceu o PFL. Qual a teoria? Deixe o Lula sangrar até o fim, ele chega na eleição derrotado e o povo brasileiro iria buscá-lo [Fernando Henrique] em Higienópolis. Se tivesse o ACM, o Herbet Levy ou o Padre Godinho, o Lula tinha caído. E o que está por trás disso tudo? O escândalo do Mensalão. Quem está no Mensalão? O Dantas. Disse a um amigo meu quando Lula foi eleito em 2002: “Ou o Lula destrói o Dantas em três meses ou o Lula destrói seu governo”. Quase destruiu. O presidente de um fundo de pensão disse que participou do acordo da BrOi, porque era o mesmo que negociar a paz com o chefe do tráfico de uma favela. Que país é esse?


Fórum – Não se cria, em torno do Dantas, um poder maior do que ele tem de fato? Amorim – Dantas enredou Fernando Henrique Cardoso. Agora enredou o Lula. O que ele fez com FHC? Trocou o conselho da Previ ... Por quê? Porque o Dantas tem o PSDB na mão. Fórum – O Dantas tirou o senhor da TV Cultura e do UOL? Amorim – Tirou, entrou com duas notificações e a TV Cultura e o UOL me pediram para parar de falar dele. Tenho uma luta com Dantas há muito tempo, há muito tempo eu percebo que ele é especial. Mas um dia a gente vai se encontrar no despenhadeiro. Ele grampeou a mim, a minha mulher e a minha filha. Soube disso pela Polícia Federal. Essa conta ele vai acertar comigo. Ele vai acertar comigo. Nós vamos ter um encontro no despenhadeiro e vamos acertar essa conta. No plano privado. O que você acha de grampearem sua filha noiva? O que você faria?

Renato Rovai e Glauco Faria

domingo, 27 de abril de 2008


Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa

Nesta manhã de domingo, fui visitar alguns blogs e lá, na Alemanha, no canto virtual da Roseane, encontrei uma foto de Lula e José Serra, uma imagem que deve estar estampada nos jornais de hoje. Mas o interessante mesmo foi o comentário: “Por trás de uma boa causa...tem...hummm...hummmm....um plano, hummm....um jogo?!!! Ou será uma eleição?!” Roseane está certa. Por trás da cena têm eleições e alianças, cada vez mais, disformes. E por todo canto começam pipocar alianças do PT com PSDB. E entre as besteiras que o presidente Lula, às vezes, solta, está uma cantada que deu no Aécio. O tucano pode ser ungido pelo presidente como seu sucessor, desde que vá para o PMDB. E, aqui, na nossa terra, o que parecia impossível acontece: nos bastidores, o PT se oferece para o PMDB. Não acredito que o PSDB tenha mudado. Nem que o PMDB guaicuru tenha se transformado. Quem parece que está mudando de lado é a cúpula petista. Como diz o frei Betto sobre essas alianças: “Nunca vi cabeça de bacalhau, mendigo careca, santo de óculos, ex-corrupto, nem filho de prostituta chamado Júnior. Nunca imaginei que, fora dos grotões, onde o compadrio prevalece sobre princípios ideológicos, veria uma aliança entre PT e PSDB. Mas o impossível acontece em Belo Horizonte, com ampla aprovação das bases petistas (...)Os tempos e os costumes mudam, já diziam os latinos; as pessoas e os partidos também. Eu é que deveria ficar mudo, já que teimo em acreditar que fora da ética e dos pobres a política não tem salvação. Deve ser culpa de minha dificuldade de entender por que às vésperas de eleições todos debatem nomes de candidatos. E não propostas, programas e prioridades de governo.”


Nem uma coisa, nem outra
Adoro literatura Infantil. Além de ler com os meus filhos, fazendo as descobertas no mundo fantasia, quando me sinto saudosa, corro ao cantinhos deles para percorrer o mundo da imaginação. Ontem reli “Nem uma coisa, nem outra", de Moacir Scliar. Do Moacir só conheci esta obra, mas sei que é um escritor brasileiro consagrado, que, uniu num mesmo caminho o amor pela medicina e a paixão pela arte literária, escrevendo vários livros, entre eles A orelha de Van Gogh e O exército de um homem só. Em Nem uma coisa, nem outra, Moacir conta a história de uma larva que adora a sua condição de larva e, por isso, vivia um dilema: diferente de nós, humanos, que não teríamos dúvida em nos metamorfosear numa linda borboleta azul, a pequena larva, rápida, falante e inteligente, mesmo desejando voar, também adorava correr pelos galhos, adorava ser larva. Borboletas voam, mas não correm. E não que é que Tininha, a larva, consegue ter um corpo metade borboleta e metade larva, só não consegue mais voar e nem correr, fica presa num vidro – um ser raro, objeto de estudo. Um dia sonha que é borboleta, um dia sonha que é larva...às vezes, me sinto assim: um dia larva, um dia borboleta, só não consigo correr, não consigo voar, uma metamorfose incompleta.

Todo Azul do Mar - Flávio Venturini
Para o grande amor da minha vida, com quem há 18 anos, no dia 27 de abril, em Brasília, numa noite com música, arte e poesia, celebrei a decisão de partilhar teto, cama, sonhos e vida. Com quem experimento o desafio diário de reinventar o amor.


Amor Antigo
Drummond

O amor antigo vive de si mesmo,
não de cultivo alheio ou de presença.
Nada exige nem pede.
Nada espera,
mas do destino vão nega a sentença.
O amor antigo tem raízes fundas,
feitas de sofrimento e de beleza.
Por aquelas mergulha no infinito,
e por estas suplanta a natureza.
Se em toda parte o tempo desmorona
aquilo que foi grande e deslumbrante,
o antigo amor, porém, nunca fenece
e a cada dia surge mais amante.
Mais ardente, mais pobre de esperança.
Mais triste? Não. Ele venceu a dor,
e resplandece no seu canto obscuro,
tanto mais velho quanto mais amor.
Esta poesia me lembra a Kelly, a Mitie, a Dani, que também têm amores antigos.

sábado, 26 de abril de 2008

Poeta Victor Barone lança Outros Sentidos

O que seria da vida se não existissem os poetas???É tão bom tê-los nas noites de lua cheia, nos dias em que o vazio da solidão transborda, quando os sentimentos pulsam, expulsando a ausência gritante, quando o amor corta feito navalha, quando a indignação nos rouba as palavras. Como vocês, não sei viver sem poesia. Então, quero fazer um convite especial, anote aí, na agenda, e passe adiante:Lançamento do Livro Outros Sentidos do poeta Victor Barone, no dia 05 de Junho, no Marco, em Campo Grande, numa noite de lua cheia. Imperdível.


O livro nasceu assim: Victor é jornalista e um grande poeta, carioca e já sul-mato-grossense. Seus poemas já circulavam, mas nunca tinham tomado forma de livro. Um grupo de amigos se juntou e reuniu o que tinham de melhor: sonhos, fotografias e paixão pela arte. O resultado é um livro diferente, onde poemas, fotos, traços ilustrativos e projeto gráfico compõem com sinergia uma obra deliciosamente ousada, feita na raça, por amor a arte e sem nenhum patrocínio. Agora, é a sua vez de participar do projeto do livro, adquirindo-o, lendo-o, divulgando-o, deixando a poesia falar por todos os sentidos do seu corpo e da sua alma. As fotografias são de Elis Regina Nogueira, que transforma luz em imagem e poesia.

Percorrer os caminhos dos versos do Victor Barone é sentir que as palavras ganham forma, cheiro, som e sentimentos, deixando marcas na pele, no olfato, na boca. Elas provocam melodias, zunidos, transbordando o vazio deixado pelo silêncio. Às vezes, cortam feito navalha, às vezes, compõem cenários de flores, sensualidade, mansidão, senduzindo os olhares sedentos gestos, cores e paladares. O verbo do Victor preenche lacunas, ausências e faz um sapateado sobre desejos, compondo outros sentidos, tocando todos os sentidos.




Pétala - Victor Barone

Cai a pétala cara a mim.

Rodopia no ar

criando nuances e cores

de pétala que vai.

É rubra enquanto cai a pétala

que boiando no ar

tornar-se-á exangue.

Como dói ao olhar

o frenético sangrar

da flor voante.

Como sarar em meu corpo

o perene partir desta cor...?

quinta-feira, 24 de abril de 2008

A vida da atriz, a morte e as utopias libertárias

Foto:
blog O Concílio do amor

O corpo dela sangrando no chão. Ali não havia mais sonhos esfacelados. Há algum tempo eles já estavam mortos, exauridos, porque a antítese da morte não é simplesmente ter um corpo e respirar. O vazio mortífero já tinha consumido as suas entranhas, os sentimentos, o seu eu. Foi uma mutilação gradativa. Primeiro, decepando sua esperança, rasgando seu coração, como uma flor sendo cortada, esquartejada na brincadeira do bem-me-quer-mal-me-quer. Depois, sendo violada, sua genitália em flor devorada, sua essência sendo extirpada, seus mistérios rasgados pelos abutres do poder, desenhados em forma humana por pinceladas, nas quais as relações sociais são traçadas pela força fálica. Logo com ela, que conhecera o amor. Ela, a atriz, já não sabia mais o que era o texto, o contexto, o real, o imaginário, a loucura, a verdade, a mentira. E para aliviar a dor, a mágica presente na cápsula clandestina, marginal. A cápsula que, contendo o azul quando o vazio é cinza, estanca, provisoriamente, o peito que sangra. E sob o efeito do azul, a atriz dança, porque dançar é ficar nua mesmo quando o corpo é coberto de cordas em forma de roupa. O amor não bastava mais. Ela não sabia que podia confiar nos seus sentimentos, que podia acreditar na força da sua interpretação, experimentar todas as máscaras e, para o amor, se entregar inteira... ela perdera a crença em si. E perder a crença é dar a sua própria sentença de morte, é assinar o seu atestado de óbito. Ela já estava morta. Correr para a rua, o atropelamento, seu corpo esticado no chão, tudo isso foi apenas o adormecer eterno. E, assim, a atriz encerrou o seu espetáculo na arte de encenar a liberdade num regime autoritário, truculento, que teme e treme diante do sonho. Para alguns, ela foi ardilosa, dissimulada, aceitando o jogo fácil da traição. Para mim, ela já não era ela - era o seu fantasma -quando decidiu capitular e se prostituir na relação com o sistema, numa atitude tão indigna, tão vil. A vida da atriz me marcou profundamente no filme A vida dos outros, sobre um dramaturgo socialista e uma atriz, alemães orientais, que viviam em Berlim antes da queda do muro - sob um regime que nasceu para construir utopias libertárias e se rendeu ao capitalismo de Estado e à truculência do totalitarismo. E as marcas ficam.

Leia mais
sobre o filme A Vida é um Sopro:


Ela faz cinema - Chico Buarque


Beatriz - Olivia Byington

Liberdade midiática: eu quero uma pra viver

Graúna, do Henfil

Um dia desses fui dar uma palestra sobre a Mídia no Século XXI numa conferência partidária. O evento me surpreendeu. Há entre as pessoas que pensam um desejo enorme de debater o papel dos meios de comunicação na sociedade contemporânea e suas gritantes contradições. Vivemos numa sociedade democrática, mas na mídia não circulam pensamentos diferentes, não há confronto de idéias. Basta você olhar nas bancas as manchetes dos jornais nacionais: o mesmo título, a mesma abordagem. Como diz o grande mestre Bernardo Kucinski, “a ideologia de todos os veículos de grande imprensa possui o mesmo código genético”. Um parodoxo se formos comparar com a ditadura militar. Naquela época, o jornalismo vivia sob o corte nefasto da tesoura autoritária da censura e, mesmo assim, existiam veículos, como por exemplo o Correio da Manhã, que ousavam criticar o regime. Hoje, quando a sociedade reivindica o direito de ser plural, a mídia tem um pensamento único e arcaico e se comporta sob o efeito de uma auto-censura, elege as pautas que considera importante para sociedade, exclui outras sob o argumento de que é dententora de um saber especial e pode selecionar aquilo que é relevante para a opinião pública e, muitas vezes, para se apresentar como “independente” (de quem, cara pálida???), entra na era do denuncismo, não para criticar o sistema, o Estado capitalista, mas para entrar apenas no campo da moral, no superficialismo. Uma postura que Emir Sader analisa com profundidade e mostra que, em nenhum momento, do bombardeio midiático contra a corrupção se questionou o modelo de Estado. Claro, não interessa ao poder midiático as transformações sociais e econômicas e nem o pensamento elaborado, a complexidade. Cada vez mais, se trilha o caminho do maniqueísmo. Busca-se infantilizar o cidadão, por meio do entretenimento, da comoção.
Basta ver o tratamento dado domingo pelo Fantástico às eleições paraguaias e o caso da menina Isabella. Mais uma vez, um exemplo de anti-jornalismo. A revista eletrônica da Globo, emissora de maior audiência, dedicou cerca de dois minutos para falar do grande fato histórico no Paraguai, ou seja, o fim de seis décadas de tirania do Partido Colorado, e, na mesma edição, num jogo de cena dramático, pior do que novela mexicana, usou dois blocos do programa para uma entrevista de quase trinta minutos com o pai e a madrastra da menina Isabella. Em nenhum momento, a morte da garota foi contextualizada no cenário de violência contra a infância e a juventude, que vitimiza milhares de crianças nas favelas, becos e vilas.
Esse comportamento midiático é chamado por Chomsky de “fábrica de consenso”. E nessa fábrica, que opera em âmbito mundial, o pensamento divergente fica à margem. O fenômeno teve origem nos Estados Unidos e engendra um sistema de controle muito eficaz porque é subliminar, é como o ar que não vemos. “Funciona como uma certa lavagem cerebral em liberdade”. E dentro deste contexto, estão muitos jornalistas, ao mesmo tempo algozes e vítimas de suas crenças neoliberais, de sua auto-censura, do jogo competitivo. Kucinski faz um diagnóstico precioso: os jovens jornalistas sofrem muito mais do mal da censura interna, da restrição à liberdade de expressão e de criação do que o jornalistas que trabalhavam nos anos de chumbo. Os meninos e meninas da mídia compartilham os valores do neoliberalismo, como o sucesso pessoal, o individualismo, o espírito de competição e relativo descaso com os problemas sociais. “Mas a sua aplicação pelos patrões como modelo de controle das redações voltou-se contra os próprios jornalistas. Um padrão mais autoritário do que nunca, que se vale da ameaça de demissões, marca hoje as relações funcionais nas redações. A rotatividade chega a 30% ao ano”, afirma o professor.
É, por isso, que neste século XXI, são imprescindíveis os movimentos pela democratização da comunicação, resgatando-a como uma direito civil (liberdade de expressão), direito político (participação no exercício do poder público diretamente) e direito social (produção e consumo de comunicação, informação e cultura). Mas as raras exceções existem e elas são preciosas na nossa terra guaicuru.

terça-feira, 22 de abril de 2008

Michael Moore alerta: a Saúde nos EUA agoniza


* Por Kelly Garcia

Confesso que o assunto escolhido me traz certa insegurança, porque não me sinto à vontade para escrever sobre filmes. Sou apenas uma pessoa sentada na poltrona e minhas percepções são bastante instintivas. Portanto já esclareço logo de início, para os amantes do cinema e profundos conhecedores, que não vou abordar aspectos técnicos do filme Sicko - $O$ Saúde, do diretor Michael Moore, que assisti nesse final de semana no Cinecultura. Tanto Fahrenheit 11 de Setembro como no Tiros em Columbine, que garantiram, pelo menos, no Brasil a notoriedade de Moore, colocam o diretor como crítico do governo americano, especialmente, do atual presidente, o Bush. Embora muitos atribuam a Moore uma postura política de “esquerda”, suas declarações e produções dão a ele uma característica apenas de “crítico” de determinadas ações políticas. Não havendo elementos mais consistentes que permitam afirmar que “ele é socialista”, ou “é de esquerda”. Com isso quero deixar claro que não vejo no diretor uma futura liderança socialista em solo americano. O seu limite é a crítica. Aliás, que deveria ser perfeitamente entendida numa sociedade que se intitula o exemplo de democracia para todas as nações. Marketing à parte... e lucro da indústria cinematográfica...o filme tomou para mim um caráter especial porque de certa forma deu conta de extrapolar um problema interno do “gigante”, e dar para a gente a rara oportunidade de ver, literalmente, uma ferida aberta na sociedade norte-americana, provocada pela privatização total do atendimento à saúde. E poder ver o resultado disso tudo nas suas vísceras, ficou ainda mais interessante, porque sabemos que as privatizações foram defendidas e impostas por influência do governo americano em vários países, especialmente na América Latina, que operou em nome da expansão do capital e garantia de lucros dos principais investidores mundiais. Saber que nos EUA tem gente vivendo em situação de miséria não foi novidade - conforme dados recentes, são 10 milhões de pessoas vivendo nessa condição. Agora tomar conhecimento que, mesmo a um cidadão americano que tem dinheiro e condições de pagar um seguro de saúde, lhe é negado atendimento pelas empresas que controlam o ramo, isso, sim, foi uma surpresa!! E me questionei onde está a força norte-americana de reagir contra a exploração? Onde está o heroísmo norte-americano de transformar a sociedade pela democracia? Onde estão os poderosos tribunais americanos? Moore mostrou para nós, expectadores, uma sociedade americana, vigorosamente, preparada para ser apática, que acabou ficando na história à mercê daquilo que, no passado foi tão bem incutido no comportamento coletivo, o fabuloso “American way of life”, e a idéia que todos poderiam assim viver, desde que, logicamente, se esforçassem individualmente.Ao assistir o filme do Moore, foi inevitável pensar no SUS, nossa política de universalização da saúde, e me lembrei de uma participação do João Pedro Stédile em um debate sobre políticas públicas, em que defendeu ferrenhamente o SUS, dizendo que na América do Sul poucos eram os países que davam conta de atender os casos de saúde, e o Brasil, com toda a dificuldade ainda tinha uma alternativa para dar ao pobre. Defendia um movimento nacional em prol da melhoria do atendimento da saúde pública e que essa luta deveria ser de todos. Entendo o SUS como uma política de redistribuição de renda, uma das formas onde todos contribuem para que todos possam ter acesso a um tratamento de saúde.Tenho consciência dos grandes problemas no atendimento, provocados principalmente pela falta de interesse das grandes corporações econômicas, para que uma política de saúde pública funcione bem. É bom não esquecer que saúde, nesse modo de produção, é uma mercadoria e muito cara.Assim, produções como SICKO, são daquelas raras oportunidades da gente, por meio da produção Hollywoodiana, se sentir motivado a debater um tema da magnitude da política de universalização da saúde. Valeu, sétima arte!




*Kelly Garcia é advogada, Mestre em Educação, militante de esquerda e, nas horas vagas, estilista da "Maria do Povo"

domingo, 20 de abril de 2008

PÁTRIA LIVRE, VENCEREMOS! TODO CAMBIA

Foto: Agência Carta Maior

Todo cambia, tudo muda..."cambia, todo cambia...Pero no cambia mi amor, por mas lejos que me encuentre, ni el recuerdo ni el dolor, de mi tierra y de mi gente"...Pense numa pessoa com olhos brilhando, com o coração disparado de esperança, com a consciência de que está sendo testemunha de um novo tempo na nossa América Latina. Assim estou. Brotam no nosso solo latino flores vermelhas de mudança e a mudança é um processo, com avanços e recuos, contradições e conflitos.

A candidata Blanca Ovelar, do Partido Colorado, já admitiu a derrota. Fernando Lugo será o novo presidente do Paraguai e, com ele, estão os campesinos e os indígenas numa colisão muito plural e com contradições. Acredito, porém, que se Lugo não se divorciar da sua história e dos seus princípios, construirá com seu povo a República Independente e Livre do Paraguai.


Saio a caminhar
Pela cintura cósmica do sul
Piso na região
Mais vegetal do tempo e da luz
Sinto ao caminhar
Toda a pele da América em minha pele
E anda em meu sangue um rio
Que liberta em minha voz
Seu caudal

(Armando Tejada Gómez Y César Isella)

Mercedes Sosa - Canción con todos

Pesquisas de boca-de-urna confirmam vitória de Lugo no Paraguai

Federico Franco e Hebe de Bonafini acompanham Lugo até o colégio eleitoral
Foto: Agência Carta Maior

Cá estou com o coração aflito, carregado de uma solidariedade latina, sentindo e ouvindo os ventos de mudança que prometem varrer do Paraguai mais de seis décadas de domínio da violência, do totalitarismo, de corrupção e injustiças. As pesquisas de boca-de-urna confirmam o que já sabíamos: somente a fraude pode impedir a vitória do ex-bispo Fernando Lugo, da Aliança Patriótica para a Mudança, que reúne sob uma mesma legenda nove partidos políticos e diversos movimentos sociais, sindicais e indígenas. Lugo está com percentuais entre 41,7% e 43,7% dos eleitores. A segunda colocada, Blanca Ovelar, do Partido Colorado, apoiada pelo atual governo, está com 36,4% e 38,2% e o general Lino Oviedo, ex-golpista conhecido no Brasil, aparece com percentuais entre 15,7% e 18%.
Fraude - Segundo a Transparency, organização internacional que atua contra a corrupção, houve compra de cédulas em diversos locais de votação. Conforme divulgou a Agência Carta Maior, nos colégios eleitorais de Assunção San Martín e Iturbe, os presidentes de mesa obrigaram eleitores a introduzir cédulas nas urnas sem que tivessem sido assinadas. A Justiça Eleitoral afirmou que essas cédulas serão anuladas no momento da apuração e as pessoas não terão outra chance de votar. Carta Maior ainda diz que denúncias de postos de comando do Partido Colorado nas imediações de colégios eleitorais pipocam na imprensa e nas denúncias dos observadores internacionais. Nestes locais, militantes colorados estariam comprando votos e ameaçando opositores. Segundo relato de observadores internacionais, a polícia paraguaia demonstra-se intimidada pelos dirigentes colorados e exerce uma força tímida sobre esses acontecimentos. Organismos internacionais estão acompanhando as eleições paraguaias. Esperamos que esse olhar atento do mundo impeça uma grande fraude - somente uma grande fraude impediria a vitória de Lugo.


O dia de Lugo - A Agência Carta Maior acompanhou desde cedo o dia de Fernando Lugo. O ex-bispo recebeu apoiadores, observadores internacionais e a imprensa em sua casa, na cidade de Lambaré, região metropolitana de Assunção. Um pouco antes das sete horas da manhã, o candidato percorreu a pé as sete quadras que separam sua residência da escola Luisa Tavalera Ritchert, no bairro Villa Ybate, local de votação do candidato. De braços dados com Lugo, estava o brasileiro Frei Betto. Além de dezenas de militantes, Hebe de Bonafini, das Madres da Plaza de Mayo, e Bernard Cassen, do Le Monde Diplomatique, formavam a comitiva que acompanhou a caminhada de Lugo até a mesa de votação. Cassen e Frei Betto são dois dos vários observadores internacionais de onze nacionalidades convocados para acompanhar as eleições paraguaias. Depois de votar, Lugo foi à missa.

"Ele vai somar nessa primavera democrática da América do Sul. Tivemos três grandes perfis nestes últimos na América Latina. As ditaduras militares, os governos neoliberais e, agora, a busca de candidatos populares. Não quer dizer que necessariamente eles farão um governo melhor que os neoliberais, mas de qualquer maneira é um repúdio às antigas oligarquias donas da política. Lula, Morales, Chávez e o próprio Lugo representam esse processo”, assinalou Frei Betto, sentado ao lado de Lugo durante a missa."

Fonte: Agência Carta Maior

Todo Cambia - Mercedes Sosa


sábado, 19 de abril de 2008

Hasta la victoria siempre, Lugo!

Daniel e Lugo - Foto: Carta Maior

Daniel Viglietti, músico uruguaio e militante tupamaro:
"O conceito de pátria grande me acompanha desde que nasci. Sou muito uruguaio, mas pertenço a outra pátria, esta onde se pode ser uruguaio, argentino, brasileiro, paraguaio, mexicano. Somos todos parte disso que José Martí chamava de Nuestra America. É isso que me faz estar aqui, que cante no ato de fechamento de campanha de Fernando Lugo".

A desalambrar -Daniel Viglietti

Yo pregunto a los presentes
Si no se han puesto a pensar
Que esta tierra es de nosotros
Y no del que tenga mas
Yo pregunto si en la tierra
Nunca habrá pensado usted
Que si las manos son nuestras
Es nuestro lo que nos den
A desalambrar A desalambrar
Que la tierra es nuestra
Tuya y de aquel
De pedro y maria
De juan y jose
Si molesto con mi canto
Alguno que venga a oír
Le aseguro que es un gringo
O un dueño de este país
A desalambrar A desalambrar
Que la tierra es nuestra
Tuya y de aquel
De pedro y maria
De juan y jose

Victor Heredia canta para a multidão paraguaia sedenta de mudança

Foto: Blog Celeuma
O portenho Victor Heredia marcou com muita emoção a festa de encerramento da campanha de Fernando Lugo a presidência do Paraguai. Abriu a voz, rasgou o seu canto, diante de uma manifestação de 120 mil pessoas, em frente do Congresso Nacional, na última quinta-feira. São os ares de mudança, são os gritos por uma pátria livre, que reúnem uma multidão em festa e recebe o apoio de artistas latinos. Ao saber que Heredia entoou "Todavia Cantamos", daqui, o meu coração bateu forte, muito forte, interligado aos sonhos dos que ousam sonhar com um Paraguai independente.
“Sobram apenas três dias aos que sequestraram a esperança do povo paraguaio”, afirmou Lugo. Às mulheres, às comunidades originárias e aos jovens, ele disse: “Sou simplesmente um companheiro de caminhada com vocês. Sonhem e construam conosco esta nova pátria”.
De acordo com reportagem de Clarissa Pont na Agência Carta Maior, o último comício da Aliança Patriótica para a Mudança iniciou às 4 da tarde e só terminou à meia-noite. Fernando Lugo e o candidato a vice-presidente Federico Franco receberam nomes importantes da música latino-americana, como o uruguaio Daniel Viglietti e a argentina Liliana Herrero. Do Brasil, Chico Batera, percursionista de Chico Buarque, esteve em Assunção para apoiar o candidato da Aliança.
Favorito nas pesquisas de intenção de voto, o candidato Fernando Lugo proclamou igualdade para todos e afirmou que o povo paraguaio tem de ser protagonista de sua própria história.

Todavia Cantamos
Todavía cantamos, todavía pedimos,
todavía soñamos, todavía esperamos
a pesar de los golpes
que asestó en nuestras vida
sel ingenio del odio,
desterrando al olvido
a nuestros seres queridos.
Todavía cantamos, todavía pedimos,
todavía soñamos, todavía esperamos
que nos digan adonde
han escondido las flores
que aromaron las calles
persiguiendo un destino,
¿dónde, dónde se han ido?
Todavía cantamos, todavía pedimos,
todavía soñamos, todavía esperamos
que nos den la esperanza
de saber que es posible
que el jardín se ilumine
con las risas y el canto
de los que amamos tanto.
Todavía cantamos, todavía pedimos,
todavía soñamos, todavía esperamos
por un día distinto,sin apremios ni ayuno,
sin temor y sin llanto,
porque vuelvan al nido
nuestros seres queridos.
Todavía cantamos, todavía pedimos,
Todavía soñamos, todavía esperamos...

...

sexta-feira, 18 de abril de 2008

19 de abril - Todo dia é Dia de Índio

Foto: Campanha Guarani

Carta Compromisso YVY POTY
em Defesa da Vida, Terra e Futuro

Nós, do povo Guarani, desde os tempos quando nasceram nossas raízes mais profundas, acreditamos que a natureza é vida, assim como a terra é o chão onde pisamos, com muita firmeza, seguro e sem medo.
Para nosso povo não é possível esquecer que a terra é o suporte que sustenta toda natureza, toda vida, porque depois que Tupã fez a natureza percebeu que não tinha quem admirasse os rios, a mata e as montanhas. Foi daí que Tupã pensou e criou o Guarani para admirar toda a beleza que fez.
Por isso, nós somos a flor da terra, como falamos em nossa língua: Yvy Poty. Fomos criados pela natureza, por isso ela está sempre a nosso favor, nos ama, nos alimenta e dá a vida por nós, seres humanos.
A água, tão preciosa, sem cor, sem cheiro, cristalina, que vive dentro da gente, respira em nosso corpo e evapora no ar. Formando nuvens de amor de onde cai a chuva para enverdecer as matas, crescer os brotos; as flores para perfumar o universo e alimentar as abelhas que fazem o doce mel; e as frutas para alimentar os pássaros e outros animais.
O mato traz sombra e vitamina para terra e os rios que correm dentro do corpo da terra, como o sangue em nossas veias.
Mas a maldade cruel faz o fogo da morte passar no corpo da terra, secando suas veias. O ardume do fogo torra sua pele. A mata chora e depois morre. O veneno intoxica. O lixo sufoca. A pisada do boi magoa o solo. O trator revira a terra.
Fora de nossas terras ouvimos seu choro e sua morte sem termos como socorrer a Vida.
Chegou a hora de defender a vida do fogo da morte. Defender a vida como Tupã nos entregou: a vida dos rios, das matas, dos pássaros, de todos os animais, das nossas crianças!
Nessa luta pela vida necessitamos contar com o compromisso, a união, a força e a coragem de todas as mulheres, homens e crianças de nosso Grande Povo Guarani.
Nossos povos irmãos que também nasceram desta terra, e há mais de quinhentos anos resistem em seus sonhos, cantos, rezas, danças e línguas, também devem lutar pela vida.
A lembrança dessa terra imaculada está na memória das pedras, das águas e do sangue que corre nas veias de cada morador deste continente.
Em defesa da vida e da terra fazemos um convite para que cada um resgate essa memória, conheça nossa cultura e lute conosco para traçar juntos o caminho para um futuro de liberdade. O Horizonte é a meta, caminhar juntos é o objetivo.
Comissão de Lideranças e Professores em Defesa dos Direitos Guarani Kaiowá
A Campanha Povo Guarani, Um Grande Povo é uma iniciativa do Movimento pela Vida, Terra e Futuro do Povo Guarani, uma proposta aberta a todos os interessados em construir conjuntamente uma nova História, que reconheça os valores e os direitos dos Guarani.

Povo Garani, Grande Povo!

O que teriam em comum o livro escrito pelo autor José de Alencar em 1857; uma ópera composta pelo maestro Carlos Gomes no ano de 1870; o movimento intelectual que influenciou toda a arte modernista na década de 1920; a obra de arte brasileira que alcançou o maior valor no mercado internacional, um milhão e meio de dólares, pintado em 1928 por Tarsila do Amaral; uma missa teatral composta pelo cantor Milton Nascimento e o bispo Dom Pedro Casaldáliga; o time de futebol campeão brasileiro em 1979; e o filme do diretor Rolland Joffe vencedor do principal prêmio, a palma de ouro, do Festival de Cinema em Cannes no ano de 1986?
O romance “o Guarani”, a ópera “Guarani”, o manifesto cultural “Antropofágico”, o quadro “Abapuru”, a “Missa da Terra Males”, o time “Guarani Futebol Clube” de Campinas e o filme “A missão” foram criados com inspiração em um Grande Povo que tem ligação vital com as terras do nosso continente. Este povo que luta para defender esta terra desde tempos que nossa memória não seria capaz de alcançar é o Povo Guarani.
Emissoras de rádio e tv, refrigerantes, supermercados, hotéis, leite, café, restaurantes, açúcar, material de limpeza ... além de servir de inspiração para as artes e para os esportes, o mercado ainda tem uma infinidades de produtos comercializados que recebem o nome do povo ou utilizam palavras da língua Guarani. Em todos os lugares é possível encontrar nomes que fazem referência a este povo: o grande aqüífero, lagos, cidades, bairros, ruas, praias, rios, montanhas, animais...
No entanto, apesar de tão presentes em nosso cotidiano, o povo Guarani permanece praticamente invisível para todos, especialmente aos olhos dos que querem varre-los para fora de nossa história poder público.
Ao longo dos séculos, a sociedade brasileira jamais foi capaz de ouvir a voz sagrada dos rezadores do povo Guarani, mesmo quando esta voz foi um grito de socorro contra o genocídio que enfrentam. Ao longo dos séculos, a sociedade brasileira vem ignorando a luz do sorriso das mulheres e crianças do Povo Guarani. Talvez por vergonha e culpa, ao longo dos séculos, a sociedade brasileira tenha apagado da memória as belas páginas de resistência escrita pelos bravos guerreiros do povo Guarani.
O pouco que se sabe por meio do noticiário é de seu sofrimento: que suas terras estão praticamente todas invadidas; que suas crianças morrem por falta de comida; que são vítimas de altos índices de assassinato praticados por seus inimigos; que o Estado desrespeita completamente os direitos mínimos para sua sobrevivência firmados na Constituição Federal e em Convenções Internacionais.
Por isso, o povo decidiu se rearticular e lançar a
Campanha Povo Guarani Grande Povo!

O GUARANI - UMA ÓPERA ELETRÔNICA
Uma versão linda da Ópera O Guarani, do maestro Carlos Gomes

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Trabalho Escravo em Mato Grosso do Sul: cadê a princesa Isabel? Cadê as camélias brancas?

Indústria da cana-de-açúcar eleva o número de
casos de trabalho escravo. As principais vítimas são os
indígenas. É assim que o governo brasileiro quer promover o
"desenvolvimento" - Foto: NSilva

Não, ele não era gente, humano. Não. Ele tinha até um rosto. Sim, um rosto sujo, é verdade. Não, ele não era uma pessoa. Ele tinha um telencéfalo altamente desenvolvido e polegar opositor, que o diferenciava dos animais. Mas ele não era humano. Ele tinha até uma família, filhos, mãe, pai, uma história. Ele tinha uma voz, uma voz muda, presa, é verdade. O verbo não conjugado, dilacerado no amargo da dor espremida no bagaço doce da cana. Mas não, ele não era gente. A vaca, sim, era humana. Ela tinha um nome, tinha o melhor alimento, o melhor canto para dormir. A vaca tinha até vacinas periódicas, médico veterinário com visitas constantes. Tinha brinco, banhos, cuidados, claro, a vaca não podia adoecer, morrer. A vaca não tinha um telencéfalo altamente desenvolvido e polegar opositor, mas era humana. Ele não, ele era uma coisa, uma coisa que deveria ser programada para cortar cana, cortar, cortar, cortar - o corte da sua essência humana, que sangra aquilo que um dia foi um eu. Seu alojamento, uma pocilga. Seu trabalho, que tanto foi dito que dignifica o homem, uma prisão humilhante, degradante...Seu nome poderia ser Pedro, João, Antônio. Claro, ele era um Zé Silva, a vaca, uma Nelore. Ele era mais um dos 1,6 mil trabalhadores de Mato Grosso do Sul resgatados, em 2007, de condições análogas à de escravidão, um número superior em quase trinta vezes ao de 2006, quando 29 pessoas foram resgatadas em condições semelhantes. Pasmem! Dos 1.600 resgatados, 1.011 eram indígenas. Isso em pleno século XXI, na era da globalização, Internet 1, 2 e 3, satélites, bombas inteligentes.
De acordo com o documento divulgado na última terça-feira em Brasília pela CPT (Comissão Pastoral da Terra), elaborado a partir de dados oficiais do Ministério do Trabalho e Emprego, foi em Mato Grosso do Sul que se registrou a pior situação de exploração de trabalhadores no ano passado, situação que contraria os tratados e resoluções internacionais, dos quais o Brasil é signatário.
Reportagem da jornalista Marta Ferreira sobre o relatório da CPT, publicada no Campo Grande News http://www.campogrande.news.com.br/canais/view/?canal=8&id=224913, mostra que os casos de trabalhadores sul-mato-grossenses em situação irregular representam 67% dos registros no Centro-Oeste. Na região, foram resgatados no ano passado 2409 trabalhadores, um total 284% maior. O número de denúncias cresceu de 29 para 43. Em MS, elas passaram de três casos, em 2006, para 13 em 2007, envolvendo 11 cidades. O aumento do número de trabalhadores em regime de escravidão está relacionado ao crescimento da produção de cana na última safra, estimado em 30%. A tendência é agravar ainda mais a situação. Atualmente, 11 usinas de álcool estão instaladas no Estado, 31 estão em implantação e 28 em negociação, totalizando 70 usinas. Para 2008, o IBGE estima um crescimento da área de plantio de cana, em pelo menos, 30%, aumentando a área de 199,7 mil hectares, em 2007, para 260 mil hectares.
É na indústria da cana que o governo do Estado e o governo federal concentram suas forças, assumindo a sua condição servil aos interesses das grandes potências. Neste caso, aos interesses principalmente de Bu$h, dos Estados Unidos, que mantêm fechadas as suas portas ao produtos do mercado externo, aplicam uma política protecionista e, ainda, determinam o que devemos plantar, colher e vender. E, mais uma vez, nos comportamos como colônia.
Reportagem de Cristiano Navarro no Jornal Brasil de Fato mostra que em Mato Grosso do Sul a exploração de mão-de-obra indígena, em condição degradante, é premiada com isenção de impostos. Devido à isenção dada às usinas de álcool, o Estado deixará de receber, em 2008, R$ 394 milhões.
É assim que em solo sul-mato-grossense, uma vaca no pasto vale mais do que a vida de um trabalhador, especialmente, se ele for índio. Cadê a princesa Isabel? Cadê as camélias brancas, cultivadas no quilombo do Leblon, como símbolo do abolicionismo? Talvez devêssemos mesmo era cultivar urucum, pintar a cara de vermelho e fazer a guerra da cidadania, limpando as manchas cruéis e vergonhosas da escravidão.