sábado, 31 de maio de 2008

Mulheres que amo


Hilda Hilst


Aquele outro não via...
Aquele outro não via minha muita amplidão

Nada lhe bastava. Nem ígneas cantigas.
E agora vã, te pareço soberba, magnífica
E fodes como quem morre a última conquista
E ardes como desejei arder de santidade.
(E há luz na tua carne e tu palpitas.)
Ah, por que me vejo vasta e inflexível

Desejando um desejo vizinhante
De uma fome irada e obsessiva?

Anais Nin

"As carícias da noite anterior
haviam sido intensamente maravilhosas,
como todas as chamas multicolores
de um engenhoso fogo de artifício,
irrupções de sóis e neons
explodindo no interior do corpo,
velozes cometas
dirigidos a todos os centros de prazer,
estrelas cadentes de profundas alegrias..."


Florbela Espanca

Ódio?
Ódio por ele? Não...

Se o amei tanto,
Se tanto bem lhe quis no meu passado,
Se o encontrei depois de o ter sonhado,
Se à vida assim roubei todo o encanto...
Que importa se mentiu? E se hoje o pranto

Turva o meu triste olhar, marmorizado,
Olhar de monja, trágico, gelado
Como um soturno e enorme
Campo Santo!
Ah! nunca mais amá-lo é já bastante!

Quero senti-lo d’outra, bem distante,
Como se fora meu, calma e serena!
Ódio seria em mim saudade infinda,

Mágoa de o ter perdido, amor ainda.
Ódio por ele? Não... não vale a pena...


Virginia Woolf


... quando de repente se apagou a luz. Tínhamos caído. Tudo estava extinto. Não havia cor. A terra estava morta. Esse foi o momento espantoso; e o próximo quando, como que uma bola que tivesse ressaltado, a nuvem ganhou de novo cor, apenas uma pincelada de uma cor etérea, e assim voltou a luz. Tive um sentimento muito forte de que a luz se tinha ido embora numa poderosa obediência; como que algo ajoelhando-se e levantando-se subitamente quando as cores voltaram. Regressaram sobre o vale e as colinas com espantosa luminosidade e rapidez e beleza — primeiro, miraculosamente cintilantes e etéreas, depois, quase como normal, mas com uma grande sensação de alívio. Era como uma recuperação. Tínhamos estado muito pior do que o que pensávamos. Tínhamos visto o mundo morto. Era um dos poderes da natureza. A nossa grandeza também tinha sido aparente.



quinta-feira, 29 de maio de 2008

Foto: Blog Canto da boca

Aviso da Lua Que Menstrua
Elisa Lucinda

Moço, cuidado com ela!

Há que se ter cautela com esta gente que menstrua...
Imagine uma cachoeira às avessas:
Cada ato que faz, o corpo confessa.
Cuidado, moço!
Às vezes parece erva, parece hera
Cuidado com essa gente que gera
Essa gente que se metamorfoseia
Metade legível, metade sereia.
Barriga cresce, explode humanidades
E ainda volta pro lugar que é o mesmo lugar
Mas é outro lugar, aí é que está:
Cada palavra dita, antes de dizer, homem, reflita..
Sua boca maldita não sabe que cada palavra é ingrediente
Que vai cair no mesmo planeta panela.
Cuidado com cada letra que manda pra ela!
Tá acostumada a viver por dentro,
Transforma fato em elemento
A tudo refoga, ferve, frita
Ainda sangra tudo no próximo mês.
Cuidado moço, quando cê pensa que escapou
É que chegou a sua vez!
Porque sou muito sua amiga
É que tô falando na "vera"
Conheço cada uma, além de ser uma delas.
Você que saiu da fresta dela
Delicada força quando voltar a ela.
Não vá sem ser convidado
Ou sem os devidos cortejos..
Às vezes pela ponte de um beijo
Já se alcança a "cidade secreta"
A atlântida perdida.
Outras vezes várias metidas e mais se afasta dela.
Cuidado, moço, por você ter uma cobra entre as pernas
Cai na condição de ser displicente
Diante da própria serpente
Ela é uma cobra de avental
Não despreze a meditação doméstica
É da poeira do cotidiano
Que a mulher extrai filosofando
Cozinhando, costurando e você chega com mão no bolso
Julgando a arte do almoço: eca!...
Você que não sabe onde está sua cueca?
Ah, meu cão desejado
Tão preocupado em rosnar, ladrar e latir
Então esquece de morder devagar
Esquece de saber curtir, dividir.
E aí quando quer agredir
Chama de vaca e galinha.
São duas dignas vizinhas do mundo daqui!
O que você tem pra falar de vaca?
O que você tem eu vou dizer e não se queixe:
Vaca é sua mãe, de leite.Vaca e galinha...
Ora, não ofende. enaltece, elogia:
Comparando rainha com rainha
Óvulo, ovo e leite
Pensando que está agredindo
Que tá falando palavrão imundo.
Tá, não, homem.
Tá citando o princípio do mundo!

terça-feira, 27 de maio de 2008

Clarice Lispector no palco


Clarice Lispector faz malabarismo de sentimentos com as palavras. É anticonvencional. Quebra as máscaras. Ao mesmo tempo em que se desnuda na criação literária, se resguarda num mistério. "Eu nunca fui livre na minha vida inteira. Por que dentro eu sempre me persegui. Eu me tornei intolerável para mim mesma." Ao ler os seus textos sinto que viajo pelos labirintos do meu interior. “Estou sentindo uma clareza tão grande que me anula como pessoa atual e comum: é uma lucidez vazia, como explicar? Assim como um cálculo matemático perfeito do qual, no entanto, não se precise. Estou por assim dizer vendo claramente o vazio. E nem entendo aquilo que entendo: pois estou infinitamente maior que eu mesma, e não me alcanço”. Fico imaginando as palavras de Clarice no palco, interpretadas com os sentimentos plurais dessa mulher que, a exemplo de outras extraordinárias, também sofria da “doença da alma”, conseguia ser múltipla, amando e odiando, experimentando a liberdade e a prisão, ousando com palavras secas e úmidas.: “Onde aprender a odiar para não morrer de amor?" Vou ter o privilégio de experimentar, como espectadora, o doce e o amargo de Clarice no palco. Um espetáculo que, sob a direção de Nill Amaral, está revolucionando a história do teatro sul-mato-grossense. Nill também é assim: extraordinário, instigante, ousado, criativo.

No gosto doce e amargo das coisas de que somos feito
6, 7 e 8 de junho no Depósito Cênico do Sesc Horto
Imperdível!
"Estou procurando, estou procurando. Estou tentando entender. Tentando dar a alguém o que vivi e não sei a quem, mas não quero ficar com o que vivi. Não sei o que fazer do que vivi, tenho medo dessa desorganização profunda. Não confio no que aconteceu. Aconteceu-me alguma coisa que eu, pelo fato de não saber como viver, vivi outra? A isso queria chamar desorganização, e teria a segurança de me aventurar, porque saberia depois para onde voltar: para a organização interior. A isso prefiro chamar desorganização pois não quero me confirmar no que vivi - na confirmação de mim eu perderia o mundo como eu o tinha, e sei que não tenho capacidade para outro."
Clarice Lispector

domingo, 25 de maio de 2008

Para compreender a "falta de alimentos" no mundo

Tela Portinari - Retirantes

Por sugestão da Miti, leitora assídua, mediadora, crítica participativa do Maria-Sem-Vergonha e preocupadíssima com as questões do nosso tempo, publico abaixo um artigo que analisa o discurso propagado nos últimos dias sobre alimentos. Vale a pena lê-lo mesmo.

Dom Demétrio Valentini *

Um calafrio percorre o mundo. Está faltando alimentos. E os que existem estão se tornando muito caros. Só num ano o trigo subiu 130%. E na Ásia o arroz duplicou de preço em três meses.
Segundo cálculos da FAO, esta subida de preços aumentou o número dos famintos em cem milhões, que se acrescentam aos 845 milhões já existentes antes da crise atual.
O que está acontecendo?
A pergunta é pertinente. Analisando melhor alguns dados, salta aos olhos que na origem desta crise existem distorções que precisam ser identificadas, denunciadas e corrigidas.
Em 2007 a produção mundial de grãos foi de 2 bilhões e 300 milhões de toneladas. Um aumento de quatro por cento sobre o ano anterior. Portanto, a crise não vem da diminuição da safra.
De 1961 a 2007 a produção de grãos no mundo triplicou, enquanto a população somente duplicou. São dados que precisam estar presentes numa análise atenta para compreender o que se passa.
O Brasil se orgulha de ser um país exportador de grãos. Calcula-se que a safra de grãos neste ano chegará a 139 milhões de toneladas. Parece muito. Mas é pouco. Os Estados Unidos, só de trigo produzem 150 milhões de toneladas. No Brasil existem terras ociosas, em toda parte. Por que não são
cultivadas?
A crise atual denuncia o desvirtuamento da agricultura, em todo o seu processo produtivo. É preciso voltar ao bom senso, e recuperar a finalidade primordial da agricultura, que é a de produzir alimentos para saciar a fome da humanidade. E não fazer dela um mercado lucrativo para os que especulam com a fome das pessoas.
Introduziu-se na agricultura a especulação financeira. De acordo com Paul Waldie, no ano dois mil havia perto de cinco bilhões de dólares apostando na variação dos preços agrícolas. Dinheiro que não se destinava a comprar nenhuma tonelada física, mas só especulava em cima da variação de preços. Em 2007 este número saltou para 175 bilhões de dólares, aplicados na
especulação que produz lucros às custas das manobras para aumento dos preços agrícolas.
Esta a primeira perversão da agricultura. A agricultura se tornou um negócio especulativo. No Brasil esta especulação se materializa na concentração em quatro ou cinco grandes companhias transnacionais que dominam o mercado exportador de grãos. A agricultura virou negócio especulativo.
Outra perversão está no sistema produtivo. Quem mais produz alimentos, está provado, é a agricultura familiar. A produção de alimentos supõe um relacionamento efetivo e afetivo do agricultor com a terra. Este relacionamento torna viável a permanência do agricultor em sua propriedade, para nela cuidar da plantação com a dedicação e competência que ela requer. Mas o governo prefere se encantar com as grandes empresas, que fazer da agricultura o "agro negócio", cujos parâmetros de eficiência são o lucro, não o atendimento das necessidades de alimentos da população.
Mas, em cima da agricultura caem outras especulações, sobretudo através do preço dos insumos. A desculpa para o seu constante aumento era o preço do dólar, dado que muitos dos seus ingredientes precisam ser importados. Agora o dólar baixou. Mas os insumos continuam subindo. De tal modo que o agricultor continua apertado. Diante desta situação, o governo permanece na inércia, reverenciando submisso as "leis do mercado", que não podem ser alteradas pelo Estado.
A crise é sinal de alerta para, se repensar por inteiro a agricultura. De vez em quando a própria realidade se encarrega de sacudir as consciências e convocar para o bom senso. Na Campanha da Fraternidade deste ano constatamos a urgência de escolher a vida. Agora, a crise de alimentos nos ensina que é a realidade que nos escolhe, nos adverte, se em tempo queremos entender os apelos que ela nos faz.


* Bispo de Jales, São Paulo.
Victor Heredia - Sobreviviendo


sábado, 24 de maio de 2008

Like a Rolling Stone
Bob Dylan



Como Uma Pedra Que Rola*

Era uma vez, você se vestia tão bem
Jogava esmola aos mendigos em seu auge
Não foi?As pessoas chamavam, dizendo
“Cuidado boneca Você está pedindo pra cair”
Você achou que todos eles estavam brincando com você
Você costumava rir
de todo mundo que ficava vadiando ao redor
Agora você não fala tão alto
Agora você não parece tão orgulhosa
De estar tendo que vasculhar pela sua próxima refeição
Como se sente?Como se sente?
Por estar sem um lar?
Como uma completa estranha?
Como uma pedra que rola*?
Você freqüentou a melhor escola
Muito bem, Senhorita Solitária
Mas você sabe que você apenas ficava enchendo a cara lá
E ninguém jamais lhe ensinou
Como viver nas ruas
E agora você descobre (que)
Você vai ter que se acostumar com isso
Você dizia que jamais condescenderia
Com o vagabundo misterioso, mas agora você percebe
Que ele não está vendendo álibis
Enquanto você olha fixamente para o vácuo de seus olhos
E o pergunta, você quer fazer um trato?
Como se sente?Como se sente?
Por estar por sua conta?
Sem nenhuma direção para casa
Como uma completa estranha?
Como uma pedra que rola*?
Você nunca se virou para ver as carrancas
Dos equilibristas e dos palhaços
Enquanto todos eles chegavam
E faziam truques para você
Você jamais entendeu que isso não é bom
Você não deveria deixar as outras pessoas
Se divertir no seu lugar
Você antigamente cavalgava o cavalo cromado
Com seu diplomata
Que carregava em seu ombro um gato siamês
Não é difícil quando você descobre que
Ele realmente não era tudo que aparentava ser
Depois que ele levou de você tudo que podia roubar?
Como se sente?Como se sente?
Por estar por sua conta?
Sem nenhuma direção para casa
Como uma completa estranha?
Como uma pedra que rola*?
Princesa no campanário e todas as pessoas bonitas
Estão todas bebendo e pensando que estão por cima
Trocando presentes caros e coisas
Mas é melhor você surrupiar o seu anel de brilhante
É melhor você penhora-lo, gata
Você antigamente era tão entretida
Com o Napoleão de trapos e a linguagem que ele usava
Vá para ele agora, ele te chama, você não pode recusar
Quando você não tem nada, você não tem nada a perder
Você está invisível agora
Você não tem mais segredos a ocultar
Como se sente?Como se sente?
Por estar por sua conta
Sem nenhuma direção para casa
Como uma completa estranha?
Como uma pedra que rola*?

*como uma pedra que rola = perdido(a) na vida

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Maio de 68 - 40 anos depois

Estudantes em Paris, Maio de 68


Em maio de 68 eu tinha apenas sete meses de vida. Entretanto, a geração desse período, que protagonizou barricadas, protestos e revolucionou comportamentos, marcou profundamente a minha juventude e a minha vida. A força das suas idéias foi além de um mês, uma data, de uma camiseta, de uma música, dos filmes do Godard e Truffaut, do som dos The Rolling Stones, Jimi Hendrix e tantos outros. Seus ideais marcaram décadas. A crítica à alienação e à cultura do espetáculo, a reivindicação da ousadia na política, o grito por democracia e liberdade, o anúncio da necessidade de se resistir ao autoritarismo, ao arbítrio, ao consumismo, construíram uma identidade que tornou-se referência para jovens de diferentes regiões do planeta. Paris não foi o único centro da rebeldia. Nos Estados Unidos, a guerra do Vietnã, então no auge, viria a levar a juventude às ruas e a fortalecer o movimento pacifista. Na Califórnia, na cidade de San Francisco, contemporaneamente a Maio 68, florescia o movimento hippie, sucedendo a beat generation. No Brasil, o movimento estudantil resistia nas universidades e nas ruas contra a ditadura militar. Fidel e Che Guevara, este último assassinado em outubro de 67, eram ícones que inspiravam a juventude. Na África, aconteciam movimentos anti-colonialista. Na Alemanha e em diversos pontos da Europa também eclodiram manifestações estudantis. Emergiam ideiais libertários.
Entre as palavras de ordem da juventude de 68, estavam “não confie em ninguém com mais de trinta”, “é proibido, proibir” ou “sejam realistas, peçam o impossível”. A ousadia dava forças, inclusive, para enfrentar o aparato repressivo. Vivia-se intensamente o tempo presente por causa de um futuro que iria chegar. Essa geração carregava sonhos e portava bandeiras. Esses sonhos eram inegociáveis. Resistia-se à mediocridade e, por um ideal e pela coletividade, poderia se dar uma vida ou muitas vidas.
Hoje, quarenta anos depois, o que sobrou dessa época que marcou o século XX? Pode-se afirmar que no inventário ficaram apenas as fotos, os filmes e algumas avaliações? Não, conforme analisa Katarina Peixoto, de forma brilhante num artigo na Agência Carta Maior, não tem como se fazer inventário porque Maio de 68 não está morto. “É por isso que toda tentativa de inventariar Maio de 68 não pode passar, também nas palavras de Debord, de gracejos ditos em jornal. Não há balanço do que não se pode inventariar, porque não há óbito do seu sentido nem do seu fundamento.” E ela mostra que as guerras continuam. É só olhar para o Iraque. A Palestina continua ocupada. A África sofre com os conflitos. Na América Latina ressurgem centelhas libertárias e a esquerda começa a retomar o poder. Cuba resiste. O Império reage. “Os lacaios do latifúndio continuam roubando, tendo privilégios e matando impunemente”, afirma. Um exemplo, acrescento, é o assassinato da irmã Dorothy Stang e a impunidade vergonhosa do assassino.
Mesmo com essas semelhanças nos acontecimentos históricos, são latentes as transformações nos últimos 40. A intensificação da globalização capitalista a partir da década de 90 e da cultura neoliberal tentaram matar o sonho e a história. Mesmo com a rebeldia de Seattle e de Porto Alegre, mesmo com as centelhas vermelhas na América Latina, a mídia, a serviço da nova ordem mundial, contribuiu com o aprofundamento da alienação, do individualismo, da mesquinhez e a morte das utopias.
No Brasil, uma parte da juventude de 68 chegou ao poder. E, todos nós que sonhamos com isso, mesmo fazendo uma crítica diferente dos oposicionistas oportunistas, amargamos muitas frustrações.
Entretanto, se é verdade que impera a mediocridade entre a juventude universitária, na garotada dos shopping centers, nos novos ricos da esquerda que mudaram de lado e transformaram bandeiras em gravatas coloridas, hinos revolucionários em hinos de time de futebol com as torcidas fanáticas ou hinos petencostais nos cultos também fanáticos, é verdade também que os ideais de Maio de 68 estão aí nos movimentos dos sem-terra, na organização dos guarani, dos ecossocialistas, dos negros e de mulheres que resistem à alienação. Como diz Karina, “eu existo também por causa de Maio de 68”. Eu também.
Zuenir Ventura, autor do livro 1968: o ano que não terminou, nos mostra que é preciso olhar para 68 sem as lentes da nostalgia e sem as lentes da negação. Ao fazer um balanço dos 40 anos, ele diz "há uma corrente pós-moderna do ceticismo, do cinismo, segundo a qual a utopia, a esperança e a solidariedade seriam sentimentos decadentes. Acho que não. São valores permanentes."

Jimi Hendrix - Like A Rolling Stone





BBHC / Janis Joplin - Piece of my Heart (1968)

quarta-feira, 21 de maio de 2008

A morte do amor e o olhar de Lou Salomé e Rilke

Tango - exposição na Pinacoteca

Sei que poderia deter o meu olhar sobre inúmeros fatos que estão acontecendo no país e no mundo. Fatos que têm um forte impacto social, como por exemplo a nomeação do Carlos Minc para o Meio Ambiente, que, obviamente, já está atraindo a fúria dos homens do agronegócio. Os senhores da moto-serra e do agrotóxico estão afirmando que o governo trocou seis por meia dúzia por causa das propostas do novo ministro, como a que proíbe empréstimos dos bancos oficiais a quem faz desmatamentos ilegais (Viva, MInc!).Também poderia abordar a caça às bruxas deflagrada contra as milhares de mulheres que fizeram abortos clandestinos numa clínica de Mato Grosso do Sul e, hoje, estão sob a mira do Ministério Público, podendo vir a ser processadas, o que considero um absurdo. Também deveria escrever sobre a falta de alimentos e, junto com a Miti, ir mais fundo nessa questão, já que algo de errado acontece nesta história. Os números não batem. E tem ainda a CPI dos Cartões Corporativos que ontem atraiu, inicialmente, a minha atenção, mas logo desisti de ver o circo pegar fogo.
Estou meio sem forças. Tenho fugido das leituras clássicas, das notícias cotidianas. Antes mesmo da morte da Aline, pressentia algo ruim. Nessas horas, fujo para o mundo da literatura. Me peguei a ler novamente Lou Salomé, essa mulher extraordinária, à frente do seu tempo, que chocou a Europa com o seu pensamento e com o seu comportamento. São essas mulheres extraordinárias que ajudam a transformar a história. Gosto da forma como ela fala e compreende o amor:
"Pois, nos seio mesmo da paixão, nunca se deve tratar de 'conhecer perfeitamente o outro': por mais que progridam neste conhecimento, a paixão restabelece constantemente entre os dois este contato fecundo que não pode se comparar a nenhuma relação de simpatia e os coloca de novo em sua relação original: a violência do espanto que cada um deles produz sobre o outro e que põe limites a toda tentativa de apreender objetivamente este parceiro. É terrível de dizer, mas , no fundo, o amante não está querendo saber "quem é" em realidade seu parceiro. Estouvado em seu egoísmo, ele se contenta de saber que o outro lhe faz um bem incompreensível... os amantes permanecem um para o outro, em última análise, um mistério."
Me instiga a pensar nesse chamado mistério porque ele faz os meus olhos brilharem. O mistério leva a surpresas e surpresas mantêm as delícias da infância. É a descoberta, o novo, a brincadeira, o lúdico. As surpresas nos deixam com o queixo caído diante do simples que se torna extraordinário: um e-mail, uma música, uma flor, um torpedo, um alô, uma poesia ou apenas um olhar. Essas são as surpresas dos gestos, mas as mais deliciosas são as da alma. Aquilo que está no outro e ainda não foi revelado.
O desafio é impedir a fusão dos seres na relação de amor. É estar com o outro sendo você mesmo, mantendo o seu espírito livre, sem anulação, sem nenhuma culpa. Vejo que no cotidiano apunhalamos o amor, tentando decifrá-lo até a última gota para tê-lo como presa do nosso egoísmo. Outras vezes, cometemos o homicídio do amor, na rotina insana que nos torma meio máquinas, seres híbridos, um misto de gente, pixels e teclados. Fazemos o ritual de morte do amor quando deixamos de perceber o outro, que começa a se passar como invisível diante dos nossos olhos.
O poeta Rilke, que foi um dos amores de Lou Salomé,enfatiza que “para quem ama, o amor , por muito tempo e pela vida afora, é solidão, isolamento, cada vez mais intenso e profundo. O amor, antes de tudo, não é o que se chama entregar-se, confundir-se, unir-se a outra pessoa. (...) O amor é uma ocasião sublime para o indivíduo amadurecer, tornar-se algo por si mesmo, tornar-se um mundo para si, por causa de um outro ser: é uma grande e ilimitada exigência que se lhe faz, uma escolha e um chamado para longe."
Assim, o amor é uma busca. E essa busca deve estar em tudo: na vida a dois, no conhecimento, na profissão, na amizade, na vida toda. Busca...Busca...
Drão - Gilberto Gil

terça-feira, 20 de maio de 2008

Carta à Marina Silva



por frei Betto

Publicado no Jornal Folha de São Paulo - 16/05/2008

Querida Marina



Caíste de pé! Tu eras um estorvo àqueles que comemoram, jubilosos, a tua demissão, os agressores do meio ambiente
CAÍSTE DE pé! Trazes no sangue a efervescente biodiversidade da floresta amazônica. Teu coração desenha-se no formato do Acre e em teus ouvidos ressoa o grito de alerta de Chico Mendes. Corre em tuas veias o curso caudaloso dos rios ora ameaçados por aqueles que ignoram o teu valor e o significado de sustentabilidade.Na Esplanada dos Ministérios, como ministra do Meio Ambiente, tu eras a Amazônia cabocla, indígena, mulher. Muitas vezes, ao ouvir tua voz clamar no deserto, me perguntei até quando agüentarias.Não te merece um governo que se cerca de latifundiários e cúmplices do massacre de ianomâmis. Não te merecem aqueles que miram impassíveis os densos rolos de fumaça volatilizando a nossa floresta para abrir espaço ao gado, à soja, à cana, ao corte irresponsável de madeiras nobres. Por que foste excluída do Plano Amazônia Sustentável? A quem beneficiará esse plano, aos ribeirinhos, aos povos indígenas, aos caiçaras, aos seringueiros ou às mineradoras, às hidrelétricas, às madeireiras e às empresas do agronegócio?Quantas derrotas amargaste no governo? Lutaste ingloriamente para impedir a importação de pneus usados e a transformação do país em lixeira das nações metropolitanas; para evitar a aprovação dos transgênicos; para que se cumprisse a promessa histórica de reforma agrária.Não te muniram de recursos necessários à execução do Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia Legal, aprovado pelo governo em 2004.Entre 1990 e 2006, a área de cultivo de soja na Amazônia se expandiu ao ritmo médio de 18% ao ano. O rebanho se multiplicou 11% ao ano. Os satélites do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) detectaram, entre agosto e dezembro de 2007, a derrubada de 3.235 km2 de floresta.É importante salientar que os satélites não contabilizam queimadas, apenas o corte raso de árvores. Portanto, nem dá para pôr a culpa na prolongada estiagem do segundo semestre de 2007. Como os satélites só captam cerca de 40% da área devastada, o próprio governo estima que 7.000 km2 tenham sido desmatados.Mato Grosso é responsável por 53,7% do estrago; o Pará, por 17,8%; e Rondônia, por 16%. Do total de emissões de carbono do Brasil, 70% resultam de queimadas na Amazônia.Quem será punido? Tudo indica que ninguém. A bancada ruralista no Congresso conta com cerca de 200 parlamentares, um terço dos membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. E, em ano de eleições municipais, não há nenhum indício de que os governos federal e estaduais pretendam infligir qualquer punição aos donos das motosserras com poder de abater árvores e eleger ($) candidatos.Tu eras, Marina, um estorvo àqueles que comemoram, jubilosos, a tua demissão, os agressores do meio ambiente, os mesmos que repudiam a proposta de proibir no Brasil o fabrico de placas de amianto e consideram que "índio atrapalha o progresso".Defendeste com ousadia nossas florestas, nossos biomas e nossos ecossistemas, incomodando quem não raciocina senão em cifrões e lucros, de costas para os direitos das futuras gerações. Teus passos, Marina, foram sempre guiados pela ponderação e pela fé.Em teu coração jamais encontrou abrigo a sede de poder, o apego a cargos, a bajulação aos poderosos, e tua bolsa não conhece o dinheiro escuso da corrupção.Retorna à tua cadeira no Senado Federal. Lembra-te ali de teu colega Cícero, de quem estás separada por séculos, porém unida pela coerência ética, a justa indignação e o amor ao bem comum. Cícero se esforçou para que Catilina admitisse seus graves erros: "É tempo, acredita-me, de mudares essas disposições; desiste das chacinas e dos incêndios. Estás apanhado por todos os lados. Todos os teus planos são para nós mais claros que a luz do dia.Em que país do mundo estamos nós, afinal? Que governo é o nosso?"Faz ressoar ali tudo que calaste como ministra. Não temas, Marina. As gerações futuras haverão de te agradecer e reconhecer o teu inestimável mérito.



CARLOS ALBERTO LIBÂNIO CHRISTO, o Frei Betto, 63, frade dominicano, escritor e assessor de movimentos sociais, é autor de, entre outras obras, "A Obra do Artista Uma Visão Holística do Universo". Foi assessor especial da Presidência da República (2003-2004).

domingo, 18 de maio de 2008

Saudades do Neruda


Fotos: blog Canto da boca

Hoje me entreguei ao nada,
me preenchi de um vazio imenso,
deixei a dor cortar a alma até anestesiar a carne,
li Neruda e,
depois de deixar o silêncio interior transbordar por todos os meus sentidos,
me preenchi de Anais Nin.

Gosto Quando te Calas

Gosto quando te calas
Gosto quando te calas

porque estás como ausente,
e me ouves de longe,
minha voz não te toca.
Parece que os olhos tivessem de ti voado
e parece que um beijo te fechara a boca.
Como todas as coisas estão cheias da minha alma

emerge das coisas, cheia da minha alma.
Borboleta de sonho, pareces com minha alma,
e te pareces com a palavra melancolia.
Gosto de ti quando calas e estás como distante.

E estás como que te queixando, borboleta em arrulho.
E me ouves de longe, e a minha voz não te alcança:
Deixa-me que me cale com o silêncio teu.
Deixa-me que te fale também com o teu silêncio

claro como uma lâmpada, simples como um anel.
És como a noite, calada e constelada.
Teu silêncio é de estrela, tão longinqüo e singelo.
Gosto de ti quando calas porque estás como ausente.

Distante e dolorosa como se tivesses morrido.
Uma palavra então, um sorriso bastam.
E eu estou alegre, alegre de que não seja verdade.


Anais Nin - Indomáveis pensamentos

"Engulo as minhas próprias palavras. Rumino e rumino até que tudo se deteriore.Cada pensamento e cada impulso é mastigado até que se transforme em nada.Quero controlar todos os meus pensamentos de uma vez, mas eles fogem em todas as direções. Se o conseguisse seria capaz de capturar os espiritos mais subtis, como um cardume de pequenos peixes de água doce. Poderia revelar inocência e duplicidade, generosidade e cálculo, medo, covardia e coragem. Pretendo dizer toda a verdade porque, para isso, teria de ser capaz de escrever quatro páginas simultaneamente, quatro longas colunas simultâneas, quatro páginas resultando numa, e essa é a razão porque não escrevo nada. Teria para isso de escrever em reverso, voltar atrás constantemente para agarrar os ecos e os acordes."

sábado, 17 de maio de 2008

Uma estrela chamada Aline


Hoje, o céu ganhou mais uma estrela. Não é uma noite qualquer. É uma noite de lua cheia - essa divindade cultuada como o símbolo da fertilidade, da pureza, da plenitude, a Mãe, o elo com o sagrado. E é a lua que acolhe essa estrela iluminada, feita de amor. O meu lado materialista não pode me limitar a aceitar que a vida finda quando o seu sopro apaga, ainda mais quando se trata de uma menina especial, feita de luz, de fala mansa, sorriso aberto, asas de anjo, sonhos de pássaro.
Os pássaros voam...e, você, Aline, agora está a voar, livre, completamente livre, sem nenhum lamento, sem nenhuma dor, ouvindo os sons que para os nossos ouvidos ainda são inaudíveis e iluminando todas as imagens que os nossos olhos não conseguem registrar. Você agora pode experimentar todos os segredos daquilo que você tanto amava: fotografias, música e gente. Sim, agora você é pura luz.
Voe alto, menina, voe, sem nenhum medo...ilumine os nossos caminhos porque a dor da saudade é grande, mas num dia desses a gente vai se encontrar e a festa vai ser grande porque, finalmente, a gente vai “pular” aquela amarelinha que você me prometeu e fazer uma ciranda alegre com muito brigadeiro e algodão doce rosa, da cor da rosa mais rosa que a terra deixou florescer. E nesta ciranda vai ter tanta gente que a gente ama. De início, só vou citar três: Cássia Eller, Renato Russo e Cazuza...vai ter tanta violada, risadas, poesia e melodias.
Beijos com amor...fique perto da lua cheia...nas minhas noites estarei do meu canto a admirá-las...e, se for possível, me ensine o caminho da serenidade para acalmar esse meu coração tão inquieto.


O Segundo Sol - Cássia Eller

Deixei a noite me abraçar

Bar Scenarium - Rio

Tenho uma grande paixão pelo Rio de Janeiro. Uma cidade desenhada pela natureza. Os morros cortados pelo mar compõem melodias que ecoam nas suas esquinas. Uma cidade escancarada que desnuda suas desigualdades e estampa belezas múltiplas pelas suas ruas. Lá, respiro uma certa paz, o que configura um paradoxo para muitos. Essa paz levemente inquieta não advém apenas das imagens que o meu olhar consegue captar. Vai além das retinas. Está no cheiro, no ar que inspiro, na música. Na última vez em que estive por lá, conheci o bar Scenarium-Pavilhão da Cultura, na Rua do Labradio, no centro Velho do Rio. Um espaço que toca o nosso corpo com o som do choro, do samba, da gafieira, do forró e da MPB. Por entre seu acervo de móveis e objetos antigos, fui fazendo descobertas irreverentes pela excentricidade da sua arquitetura do século XIX e pela sua decoração inusitada: uma cabine telefônica, guarda-chuvas coloridos, bonecas de biscuit, registradoras antigas, câmera lambe-lambe, rosas vermelhas de veludo. Uma mistura deliciosamente kitsch, o antigo, a iluminação de teatro, tudo ao mesmo tempo, num encontro com o passado, num cenário, onde você se sente a atriz, a dançarina.
Ontem, respirei por aqui um pouco do ar carioca no Rocca Botequim. Ouvi o melhor do choro num ambiente bem descontraído e aconchegante. É tão bom sentir a noite assim, ocupando aquilo que parecia oco em você, deixando, como diz a minha amiga Miti, o universo te abraçar. E abraçou.


Eu te amo - Tom Jobim





O meu amor - Chico Buarque



Álvaro Campos (Fernando Pessoa) – Todas as cartas de amor são ridículas


Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.
A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.
(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)



quinta-feira, 15 de maio de 2008

Isso é um Escândalo

Foto: J. R. Ripper/Rio


Três quartos da riqueza existente no Brasil estão concentrados nas mãos de apenas 10% da população. Esses dados são oficiais e constam do estudo "Justiça Tributária: Iniqüidade e Desafios", divulgado hoje pelo presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Márcio Pochmann, durante seminário sobre reforma tributária, promovido pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES).
De acordo com o estudo, o índice de Gini, que mede a desigualdade social de uma população, foi de 0,56 no Brasil em 2006 - o índice varia de 0 a 1, sendo 0 a perfeita igualdade e 1 a completa desigualdade. Segundo Pochmann, isso significa que a desigualdade social diminuiu no Brasil em 2006, mas ainda está no patamar do período militar e em nível pior do que antes do golpe de 1964.
Segundo o levantamento feito pelo Ipea, os 10% mais pobres do país comprometem 33% de seus rendimentos em impostos, enquanto que os 10% mais ricos pagam 23% em impostos. Trocando em miúdos: os mais pobres pagam, proporcionalmente, mais impostos do que os ricos. Então, é urgente, urgentíssima, uma reforma tributária que corrija isso.
Veja: os números do Ipea mostram que os impostos indiretos (aqueles embutidos nos preços de produtos e serviços) são os principais indutores dessa desigualdade. Os pobres pagam, proporcionalmente, três vezes mais ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) que os ricos. Enquanto os ricos desembolsam em média 5,7% em ICMS, os pobres pagam 16% no mesmo imposto. Portanto, é imprescindível desonerar o consumo e taxar a renda e o lucro. Só que diante de qualquer proposta nesta direção, a chiadeira é grande por parte dos ricos que controlam a mídia, o Congresso Nacional e setores importantes do governo.
Nos impostos diretos (sobre renda e propriedade) a situação é menos grave, mas também desfavorável aos mais pobres. O IPVA (Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores) tem praticamente a mesma incidência para todos, com alíquotas variando de 0,5% para os mais pobres a 0,6% e 0,7¨% para os mais ricos. Já o IPTU (Imposto sobre Propriedade Territorial e Urbana) privilegia os ricos. Entre os 10% mais pobres, a alíquota média é de 1,8%; já para os 10% mais ricos, a alíquota é de 1,4%. O presidente do Ipea reconhece que as mansões pagam menos imposto que as favelas, e estas ainda não têm serviços públicos como água, esgoto e coleta de lixo. Esses dados são escandalosos.

Fotos: Blog Canto da Boca

SOCORRO - Arnaldo Antunes



Socorro!
Não estou sentindo nada
Nem medo, nem calor, nem fogo
Não vai dar mais pra chorar
Nem pra rir...Socorro!
Alguma alma
Mesmo que penada
Me empreste suas penas
Já não sinto amor, nem dor
Já não sinto nada...
Socorro!Alguém me dê um coração
Que esse já não bate
Nem apanha
Por favor!Uma emoção pequena
Qualquer coisa!Qualquer coisa
Que se sinta...Tem tantos sentimentos
Deve ter algum que sirva
Qualquer coisa
Que se sinta
Tem tantos sentimentos
Deve ter algum que sirva...Socorro!
Alguma rua que me dê sentido
Em qualquer cruzamento
Acostamento, encruzilhada
Socorro!Eu já não sinto nada...Socorro!
Não estou sentindo nada
Nem medo, nem calor, nem fogo
Nem vontade de chorar
Nem de rir...Socorro!Alguma alma
Mesmo que penada
Me empreste suas penas
Já não sinto amor, nem dor
Já não sinto nada...


Socorro!


Alguém me dê um coração
Que esse já não bate
Nem apanha
Por favor!Uma emoção pequena
Qualquer coisa!Qualquer coisa
Que se sinta...Tem tantos sentimentos
Deve ter algum que sirva
Qualquer coisa
Que se sinta
Tem tantos sentimentos
Deve ter algum que sirva

quarta-feira, 14 de maio de 2008

A VOZ

Maria Tereza Horta - poeta portuguesa

Da tua voz
o corpo
o tempo já vencido
os dedos que me

vogam
nos cabelos
e os lábios que me

roçam pela boca
nesta mansa tontura
em nunca tê-los...
Meu amor

que quartos na memória
não ocupamos nós
se não partimos...
Mas porque assim te invento

e já te troco as horas
vou passando dos teus braços
que não sei
para o vácuo em que me deixas
se demoras
nesta mansa certeza que não vens

Ela é carioca - Adriana Calcanhoto
Hoje me deu vontade de ouvir Bossa Nova. E ouvi.

terça-feira, 13 de maio de 2008

Saída de Marina Silva: perde o governo, perdemos todos nós, perde o futuro



Existem algumas pessoas que não são apenas indivíduo. São entidades porque incorporam em suas vidas a expressão de uma multidão. Marina Silva é uma dessas raras pessoas. Ela é pra mim a reserva ética que existia no governo Lula – ressalto que a ética não tem nada a ver com o discurso falso moralista da direita, mas sim com os quatro princípios levantados por Leonardo Boff: dar centralidade à afetividade, sensibilidade e ao afeto; o cuidado; a cooperação, lei suprema do universo; e a responsabilidade, no sentido de que cada um tem que dar conta das conseqüências de seus atos. Assim, a ética é aquela capaz de incluir a todos na família humana. Ela se estrutura ao redor dos valores fundamentais ligados à vida, ao seu cuidado, ao trabalho, às relações cooperativas e à cultura da não-violência e da paz. Ética está associada à coerência. E era assim que Marina agia no Ministério do Meio Ambiente tentando implantar uma agenda ambiental coerente que combinasse de forma indissociável o desenvolvimento econômico, social, ambiental, ético e cultural.
Esta seringueira, de saúde frágil, mas uma gigante no enfrentamento à sanha do mercado que, sem nenhuma ética, coloca o lucro acima dos seres humanos e da vida, enfrentou grande batalhas, inclusive dentro do próprio governo. Marina combateu os defensores dos transgênicos; foi contra a instalação de usinas de cana de açúcar na bacia do pantanal, enfrentando na época o governo Zeca do PT – aliás, foi voz ativa contra o plantio de cana em áreas degradadas da Amazônia, Pantanal e Mata Atlântica; criou políticas de combate à grilagem de terra na Amazônia; agiu com rigor na concessão de licenças ambientais para as hidrelétricas; defendeu os povos indígenas, os povos das florestas.
Por enquanto, os inimigos venceram e o sinal está fechado para nós. Não foi Marina que perdeu o primeiro tempo da batalha. Foi o governo Lula. Fomos nós. É o futuro que perde com a saída de Marina.
Não fiquei indignada, infelizmente. Fiquei triste, muito triste...senti um vazio no peito, um grito sufocado. Veio a constatação de que a vida de um militante é feita de vitórias e derrotas, mas
aqui no Brasil, as derrotas têm sido sucessivas, muito sucessivas.


U2 - A Sort of Homecoming



Uma Espécie De Volta Pra Casa
E você sabe que é hora de partir
Em meio ao granizo e a neve que cai
Através dos campos da manhã para uma
Luz que está distante
E você anseia pelo momento
O momento para curar, momento de desejo
E sua terra se move debaixo (de)
Sua própria paisagem imaginária
Oh, oh, oh na fronteira nós corremos
E ainda corremos,corremos e não olhamos para trás
Eu estarei lá,eu estarei lá
Esta noite,uma estrada principal,
uma estrada principal para fora daqui
Os muros da cidade estão todos tombados
O pó uma cortina de fumaça por toda parte vejo
Rostos sulcados como os campos
Que outrora não ofereceram resistência
E nós vivemos à beira da estrada
Ao lado de uma colina enquanto os vales explodem
Deslocada, sufocada
A terra se cansa de si mesma
(oh vamos embora vamos embora vamos vamos embora digo eu)
Oh oh oh na fronteira nós corremos
E ainda corremos,corremos e não olhamos para trás
Eu estarei lá, eu estarei lá
Esta noite, esta noite
Eu estarei lá esta noite... eu creio
Eu estarei lá... de algum modoEu estarei lá... esta noite
Esta noite(oh vamos embora vamos embora vamos vamos embora digo eu)
O vento aflorará no inverno
Esta valsa de explosões e relâmpagos
Sem palavras, apenas um grito...
Hoje à noite construiremos uma ponte atravessando mar e terra
Veja o céu, a chuva ardente
Ela morrerá e viverá novamente
Esta noite
E seu coração bate tão devagar
Em meio à chuva e a neve caída
Através dos campos de manhã
Para uma luz que está distante
Oh não sofra, não chore
Pois esta noite, finalmente
Eu estarei voltando para casa
Eu estarei voltando para casa

Terra - Caetano


segunda-feira, 12 de maio de 2008

Publicidade de cerveja é inimiga social

O corpo da mulher é usado nas propagandas
para despertar o desejo da juventude, induzindo a garotada
ao consumo precoce do álccol.


E no meu domingo, entre muito beijos e abraços das crias, vibrei com o artigo de Marilene Filinto na última edição da Caros Amigos. Ela diz que a publicidade de cerveja é inimiga social. Concordo com a escitora. Já faz um tempo que tenho me incomodado com um anúncio, bastante agressivo, na TV de uma tal de Abap (Associação Brasileira das Agências de Publicidade). Essa associação tem feito um protesto contra a proibição da propaganda de bebida alcóolica e reclamado o direito à “liberdade de expressão”. Ora, a liberdade de uns não pode prejudicar a liberdade de milhões. Não é necessário ser psicólogo para perceber que as propagandas de cerveja elegem como alvo a juventude e que essa parcela da população é mais suscetível às influências, ainda mais, quando os personagens desses comerciais são mulheres quase nuas servidas em bandejas no bar da "boa". A cerveja é subliminarmente associada ao prazer, à conquista, ao poder fálico. Não diz a tal Abap que, conforme relata Marilene, cerca de 33 milhões de pessoas no Brasil consomem álcool em excesso, fator responsável por 70% das mortes violentas; 42% dos acidentes de trânsito e 45% de todos os problemas familiares e conjugais, inclusive violência sexual doméstica.
No último dia 3 de abril, a Câmara Federal recebeu de mais de 300 entidades um documento com 600 mil assinaturas pedindo a aprovação do Projeto de Lei 2733/08, que restringe a publicidade de bebidas alcoólicas. Atualmente, a legislação que trata do assunto não considera cerveja bebida alcoólica, mas apenas os produtos com teor superior a 13 graus Gay-Lusac (13° GL). Acontece que a cerveja contém 3° GL, teor suficiente para deixar uma pessoa bêbada e sem auto-controle. O projeto de lei quer considerar bebidas alcoólicas aquelas que apresentam concentração igual ou acima de meio grau GL. Se a proposta for aprovada e lutemos todos para que seja, a publicidade de cerveja será limitada a pôsteres, painéis e cartazes na parte interna dos locais de venda.
Pelo visto, a briga está apenas começando. O mercado de cerveja, de acordo com o artigo da Marilene, faturou em 2006 cerca de 22 bilhões de reais e gastou 704 milhões de reais em publicidade. Então, a liberdade de expressão reivindicada pela Abap está associada aos interesses das indústrias e não aos interesses da sociedade. Marilene lembra com muita propriedade o que diz Ignacio Ramonet sobre publicidade, censura e liberdade: “um discurso de propaganda é um discurso que procura, fabricando fatos, ou então ocultando-os, construir um tipo de falsa verdade...Que o discurso de propaganda é, falando com propriedade, um discurso de censura, porque consiste em suprimir, em amputar, em proibir certo número de aspectos dos fatos, ou até a totalidade dos fatos, a ocultá-los, a escondê-los. É preciso armar a sociedade (especialmente os jovens) contra este logro.”

sábado, 10 de maio de 2008

A maternidade e a dominação do corpo e da alma das mulheres



Ainda me lembro daquele ser pequenino virando bolinha de futebol dentro da minha barriga, sofrendo com a minha tensão na tentativa de dar forma, palavras, imagens aos sonhos socialistas na comunicação da esquerda numa das mais importantes campanhas eleitorais realizadas aqui, no final do século passado, onde a tônica era a demarcação ideológica e as contradições entre os dois projetos completamente antagônicos em disputa. Era o primeiro filho. Foi gestado num cenário onde as bandeiras ainda eram costuradas com fios trançados com a força da utopia. E, hoje, quase dez anos depois, essa criança vem me perguntar o que é axioma e reivindicar uma explicação mais precisa sobre a diferença entre delação e denúncia. É que ele está lendo Alice no País das Mentiras, de Pedro Bandeira, e quer compreender melhor os referenciais éticos daquilo que pode ser tido como verdadeiro e justo.
A maternidade ainda me assusta, me surpreende. Sabe aquele frio na barriga que, às vezes, brota diante do medo de encarar algo novo? E o coração disparado de amor só de pensar naquele ser que abre o sorriso largo quando olha para você? Como diz Elisa Lucinda, "barriga cresce, explode humanidades". Mas a maternidade não é esse estado sublime que a cultura patriarcal ainda insiste em propagar. O discurso da santificação da maternidade nos roubou da história os espaços públicos, direitos civis, políticos, profissionais e econômicos – esses últimos ainda são os mais sonegados, uma vez que de toda riqueza mundial apenas 1% pertence às mulheres. Portanto, o amor materno é resultado, não de um instinto, mas de uma construção histórica, social e cultural. Tanto é que em sociedades indígenas a maternidade é um exercício da coletividade, ou seja, as crianças são de responsabilidade de toda comunidade. Na nossa sociedade capitalista nossas crianças fazem parte do jogo competitivo do "salve-se quem puder" e muitas têm a infância roubada nos lixões, nos canaviais, na exploração sexual, nos sinais das esquinas.
A cultura dominante incutiu a idéia de éramos nascidas e destinadas a ser mães. Com a fórmula tota mulier in utero, criada a partir do determinismo biológico, justificou-se a nossa posição subalterna na sociedade, construindo o modelo “mulher-mãe-dona-de-casa" como o ideal, como fonte de prazer e realização e limitando o nosso papel social no mundo. Graças às mulheres que negaram-se a se submeter a esse determinismo, os limites que nos prendiam ao espaço doméstico foram sendo gradativamente rompidos e o nosso direito à realização pessoal foi ampliado para o campo profissional, artístico, cultural e da cidadania.
Mas hoje há na mídia uma tentativa de construir um período pós-feminista, em que supostamente as mulheres, depois de “terem conquistado tudo”, o que é uma inverdade, reivindicam a volta ao lar. Ora, mais uma vez, a maternidade é utilizada como justificativa para nos condenar à vida de lagarta, presas ao casulo, com o peso da responsabilidade exclusiva pela educação dos nossos filhos. Em pleno século XXI, a escolha ou recusa da maternidade ainda é uma questão vital na nossa luta pela emancipação, pela autonomia dos nossos corpos, pelo nosso direito ao prazer.
E no meio disso tudo, por ocasião do Dia da Mães, fico indignada com a publicidade e seus produtos de propaganda. A mediocridade, somada à cultura sexista e patriarcal, tenta nos mostrar com a velha aura de sublimes, singelas, dóceis, reforçando subliminarmente a idéia de que somente as mães são felizes e fazendo com que as mulheres não identificadas com a maternidade sejam reduzidas a corpos desapropriados de sua dimensão humana, corpos despossuídos de finalidade e de sentido, corpos secos. É a velha fórmula de associar a capacidade reprodutora ao apanágio das mulheres.
Aí, me rebelo e intensifico o diálogo com os meus pequenos para que aprendam a assumir suas responsabilidades domésticas, para que incorporem outros valores e que sejam menos forma de bola de futebol, cujo jogo é marcado pelo driblar, dominar o outro para vencer....e sejam mais do frescobol, no qual os corpos fazem movimento e suaves. Ninguém ganha para que os dois ganhem e “se deseja, então, que o outro viva sempre, eternamente, para que o jogo nunca tenha fim” (Rubem Alves).

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Os imorais falam de nós - um dia a casa cai

Zélia tocou na epiderme da nossa alma

Didio pediu. Maria-sem-vergonha atende. Imorais na voz Zélia Duncan. Aliás, ela está dominando o nosso coreto virtual nos últimos dias. Primeiro porque ela é bárbara e o seu show ainda permanece tocando os meus sentidos, a minha alma. Depois, porque, diante do cenário político, tenho preferido ouvir música mesmo. Um amigo me disse que “estamos descalços no asfalto quente”. É verdade. Tenho me sentindo assim com os últimos acontecimentos na história da esquerda na nossa terra guaicuru. UUUUUIIIIII. Asfalto quente queima mesmo.
O tempo está curto. A Net em casa caiu. Aliás, a BrasilTelecom é um caos. Não tenho conseguido escrever nas madrugadas. Mas a pauta é intensa: o movimento feminista contra as denúncias das mulheres que fizeram aborto, o lado deprê da política, solidariedade à Bolívia, Clarice Lispector, lançamento do livro do Victor Barone. Volto logo.

Imorais Zélia Duncan

Os imorais
Falam de nós
Do nosso gosto
Nosso encontro
Da nossa voz
Os imorais
se chocam
por nós
Por nosso brilho
Nosso estilo
Nossos lençóis
Mas um dia, eu sei
A casa cai
E então
A moral da história
Vai estar sempre na glória
De fazermos o que nos satisfaz
Os imorais
Falam de nós
Do nosso gosto
Nosso encontro
Da nossa voz
Os imorais
sorriram pra nós
Fingiram trégua
Fizeram média
Venderam paz
Mas um dia, eu sei
A casa cai
E então
A moral da história
Vai estar sempre na glória
De fazermos o que nos satisfaz

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Enquanto Durmo - Zélia Duncan e Lenine



Muitas perguntas
Que afundas de respostas
Não afastam minhas dúvidas
Me afogo longe de mim
Não me salvo
Porque não me acho
Não me acalmo
Porque não me vejo
Percebo até
Mas desaconselho...
Espero a chuva cair
Na minha casa, no meu rosto
Nas minhas costas largas
Eh! Eh! Eh!Espero a chuva cair
Nas minhas costas largas
Que afagas enquanto durmo
Enquanto durmo
Enquanto durmo...
De longe parece mais fácil
Frágil é se aproximar
Mas eu chego, eu cobro
Eu dobro teus conselhos
Não me salvo
Porque não me acho
Não me acalmo
Porque não me vejo
Percebo até
Mas desaconselho...

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Cuide bem do seu amor

Tela: Picasso

Circula pela Internet um texto interessante, bonito e necessário, cuja autoria é atribuída a Herbet Viana. Esse texto nos foi enviado pela Miti, que, com a sua serenidade e uma criticidade feita de doçura e beleza, acrescentou outros elementos para o debate. No centro da discussão está a ditadura da estética, a busca insana pelo corpo ideal, o vazio das almas, o "aqui e o agora". Vale a pena ler, pensar, refletir, debater. Abaixo, a Maria-sem-vergonha publica os dois textos.


Desabafo de Herbert Viana sobre os valores de hoje
*Herbert Viana

Pelo amor de Deus, eu não quero usar nada nem ninguém, nem falar do que não sei, nem procurar culpados, nem acusar ou apontar pessoas, mas ninguém está percebendo que toda essa busca insana pela estética ideal é muito menos lipo-as e muito mais piração? Uma coisa é saúde outra é obsessão. O mundo pirou, enlouqueceu.
Hoje, Deus é a auto-imagem.Religião, é dieta.Fé, só na estética. Ritual é malhação. Amor é cafona, sinceridade é careta, pudor é ridículo, sentimento é bobagem.Gordura é pecado mortal.Ruga é contravenção. Roubar pode, envelhecer, não. Estria é caso de polícia.
Celulite é falta de educação. Filho da puta bem sucedido é exemplo de sucesso. A máxima moderna é uma só: pagando bem, que mal tem?A sociedade consumidora, a que tem dinheiro, a que produz, não pensa em mais nada além da imagem, imagem, imagem.Imagem, estética, medidas, beleza. Nada mais importa.
Não importam os sentimentos, não importa a cultura, a sabedoria, o relacionamento, a amizade, a ajuda, nada mais importa.Não importa o outro, o coletivo. Jovens não têm mais fé, nem idealismo, nem posição política.Adultos perdem o senso em busca da juventude fabricada.
Ok, eu também quero me sentir bem, quero caber nas roupas, quero ficar legal, quero caminhar correr, viver muito, ter uma aparência legal, mas...
Uma sociedade de adolescentes anoréxicas e bulímicas, de jovens lipoaspirados, turbinados, aos vinte anos não é natural. Não é, não pode ser. Que as pessoas discutam o assunto. Que alguém acorde. Que o mundo mude.Que eu me acalme. Que o amor sobreviva.
'Cuide bem do seu amor, seja ele quem for...'

* Herbert Vianna* é músico

Em sintonia com Herbert Viana
*Solange Miti

Concordo bastante com as palavras escritas de Herbert Viana. Ele não fala somente do culto ao corpo. Estamos mesmo incrustados num sistema, e poucas pessoas discutem, enxergam e acordam. E assim, o mundo não vai mudar... e tende a piorar. Uma coisa é saúde, outra é obsessão. O mundo pirou, enlouqueceu. Hoje, Deus é a auto-imagem. Amor é cafona, sinceridade é careta, pudor é ridículo, sentimento é bobagem. Roubar pode, envelhecer, não. Filho da puta bem sucedido é exemplo de sucesso. A máxima moderna é uma só: pagando bem, que mal tem? Não importam os sentimentos, não importa a cultura, a sabedoria, o relacionamento, a amizade, a ajuda, nada mais importa.
Não importa o outro, o coletivo. Jovens não têm mais fé, nem idealismo, nem posição política. Adultos perdem o senso em busca da juventude fabricada. Que as pessoas discutam o assunto. Que alguém acorde. Que o mundo mude. Que eu me acalme. Que o amor sobreviva.
'Cuide bem do seu amor, seja ele quem for...'

* Solange Miti é engenheira agrônoma, designer gráfica, cidadã

Ouça e veja aqui o clip Cuide bem do seu amor:

Zélia Duncan tocou na epiderme da minha alma


Ela é pura energia. Contagiante. Voz forte. Inteligente, com toques feministas e nuances de Pagu. Uma mulher fantástica. Sensível. Bonita. Uma cantora que consegue tocar na epiderme da nossa alma. Zélia Duncan arrasou ontem, esquentando com seu canto a multidão que formou uma onda humana no Parque das Nações Indígenas. Eu estava lá entre as várias tribos, acompanhada da Kelly, minha parceira fiel de shows. Zélia reuniu a minha geração e também muitos jovens, meninos e meninas rebeldes, meninos e meninas serenos, rockeiros, casais de homossexuais, famílias inteiras. Os cheiros eram os mais diversos, mas o que me espantou mesmo nem foi o da marijuana, mas de um arguile que exalava morango - um grande cachimbo de origem indiana que faz parte das tradições árabes. Fiquei imaginando essa juventude bebendo na fonte dos sonhos da igualdade e anunciando outras verdades pelos muros, praças e avenidas. E é no meio da energia da juventude que canto:”E eu gosto de estar na terra, cada vez mais. Minha boca se abre e espera o direito ainda que profano pro mundo ser sempre mais humano...”


Me revelar - Zélia Duncan



Carne e Osso - Zélia e Paulinho Moska