quarta-feira, 9 de julho de 2008

Camille Claudel : arte e paixão consumida pela loucura


* Por Mario Doraci

Nascida em 8 de dezembro de 1864, no interior da França numa região rochosa, Claudel descobre a vocação desde os 6 anos, quando começa a modelar. Ela põe em desespero a mãe, mas agrada o pai amante de arte. Ele vai até Paris para que a filha possa desenvolver o desejo artístico. Aos 17 anos Claudel se matricula na Académie Colarossi, onde encontra o escultor Alfred Boucher. Pouco depois ela abre seu próprio atelier e começa a expor suas obras. Em 1884, ela se torna não somente aluna de Rodin, mas ela se torna a sua fonte de inspiração, a modelo, a confidente, a cara metade, a palavra, a rosa, a pessoa mais importante. Quando ela expôs suas obras no Champs Elysées, em 1899, todo mundo murmurava que ela havia plagiado Rodin. Seu talento era incontestável.
Rodin, 44, baixinho, roliço, barbudo, míope, russo, casado, gênio em estado bruto, era o mestre inconteste na escultura e ele dispensa os alunos para ter como musa e única aluna Camille Claudel. Amor, paixão e arte se misturam…eles se apaixonam e ela se torna a amante. Rodin era louco pelo entusiasmo artístico, pela inspiração e talento de Claudel. Rodin passa a viver em estado de graça, pela graça que a graça de Camille traçava em sua vida...um período de influência do expressionismo.
Rodin revive a vida sexual esquecida, morta pelo casamento de mais de vinte anos enquanto sua musa é carne fresca, um filé mignon acompanhado de tudo que sua esposa não tinha. Os anos passam, a paixão não diminui, o estilo de Claudel é singular, perfeito, inimitável. Ela era melhor que Rodin em muitas de suas obras…ela conseguira esculpir a ternura e a melancolia feminina. Mas ela não consegue vender seus trabalhos. O mercado era fechado para o mundo feminino. E Rodin não deixaria sua esposa por Claudel. A relação entre eles se degradara porque a esposa de Rodin abriu o conflito. Ele não viria ao socorro dela. Ele se aproveitou o quanto pôde. Cansada da relação de dez anos, frustrada e abandonada, ela se entrega a evidência. Vive mal em duas peças na Ilha São Luis, ao lado da catedral Notre Dame, rodeada de doze gatos. Indiretamente, Rodin vampiriza Claudel, ele contrata críticos para persegui-la, denegrir seus trabalhos. Para ela tudo se torna delírio e tempestade.
Em 1907, o Estado compra de Claudel a obra « O abandono ». Os últimos anos viram pesadelo e a razão de Camille vacila. Ela passa fome e come os restos que a zeladora do prédio joga aos gatos. Perseguida pelo sentimento de auto-destruição, ela quebra a golpes de martelo as obras em mármore e gesso de seu atelier. Paranóica, abandonada, internada num sanatório em 1913, ela sofre o silêncio da perseguição de Rodin e o preço de sua paixão. Se diz nos corredores que a obra famosa de Rodin « O pensador » foi feita por Claudel assim como outras. Claudel abre caminho para outras mulheres e enfrenta cedo o machismo dominante. Claudel começara a enxergar o oportunismo de Rodin ao afirmar que as obras dela eram frutos da inspiração dele. Ela não precisava de Rodin para voar sozinha, porque seu talento nato tinha forma, sentido e sentimento.
A ruína de Claudel foi entregar-se a um homem casado ? Foi por causa da confiança que ela depositou no mestre ? Por sua paixão mal resolvida, pelo machismo da época, pela falta de espaço ? Ela morreu em 1943 aos 48 anos no esquecimento do sanatório. Há um filme interessante sobre sua vida, vale a pena ver.


*Mario Doraci é jornalista sul-matogrossense, amigo admirável, Mestre em Ciências Políticas da Comunicação, doutorando em Ciências Políticas e Sociologia, em Paris.

6 comentários:

Maria-Sem-Vergonha do Cerrado disse...

Mario, que olhar generoso, bonito, vc lança sobre Camille...A vida dela me comove...uma grande artista, uma grande mulher, que se deixou destruir pelo machismo, pela paixão e pela sua doença...como ela, outras também se destruíram na história, mas ficaram as lições e a arte dessas senhoras...e como disse Nietzsche:"Temos a Arte para que a verdade não nos destrua.... "

Anônimo disse...

Talves Rodin nao tivesse alcançado tanta fama se nao fosse o amparo artistico e passional de Claudel...ele precisou dela e usou de seu talento. Ela abriu um novo mercado e deu o lugar da mulher numa sociedade consumida pela ordem masculina...Claudel é fascinante, sensivel e dona de si mesma, ela nao se ajoelhou aos donos da critica de arte pra consturar e construir seu mundo. Ela abriu o espaço feminino e mostrou que se pode amar, mas nao ser usada como trampolim para a gloria de outros.

Anônimo disse...

sempre da um troço qdo escrevo aqui...e entro sem querer como anonimo, nao sou anonimo, sou o mario doraci

Unknown disse...

Mario, que história triste a de Camille...eu não conhecia, grata por dividir conosco o seu acesso a informação! Estou hoje menos fã de Rodin que ontem...não conseguirei olhar "o beijo" como outrora..sem pensar em Camille.

Unknown disse...

magnífico. são essas histórias que importam. quantas e quantas pessoas não foram dessa forma exploradas e perseguidas? e o interesse de Rodin não foi amor.
até hoje a "assinatura" é valorizada e cegamente idolatrada, mais do que o talento real.
podem roubar uma idéia, uma obra e ficar famoso, mas nada mais ele irá criar. quais terão sido realmente obra dele?

Canto da Boca disse...

(A capacidade narrativa do Mario é tanta que criamos uma Paris e nos transportamos a esse cenário de paixão, amor, ódio, criação.... Por duas vezes tive a oportunidade de contemplar a obra de Rodin: uma em Fortaleza, outra em Granada, confesso que ambas me emocionaram. A primeira, num claustro e cheio de seguranças (espaço Cultural Dragão do Mar); a segunda, ao ar livre, apesar da segurança (na Calle Acera del Casino), mas a sensação absurda e conflituosa de grandeza e pequenez era a mesma...)