segunda-feira, 17 de novembro de 2008

OBAMA, NOVIDADE SIMBÓLICA

* Por Chico Alencar

É inegável: a eleição de Barack Hussein Obama como 44o presidente da República dos Estados Unidos da América do Norte representa uma novidade simbólica para o mundo. Ainda em nossa geração o racismo e a segregação marcavam aquele país, e vitimaram líderes negros grandiosos como Malcolm X e Martin Luther King.A polarização tradicional da política dos EUA, entretanto, esconde uma realidade mais diversa: além de Obama e McCain, também disputaram a presidência da ainda mais forte potência capitalista do planeta candidatos independentes (como o conhecido Ralph Nader) e candidatos do Partido Socialismo e Libertação, do Partido da Constituição, do Partido Libertário, do Partido Verde, do Partido das Proibições, do Partido dos Trabalhadores Socialistas, do Partido Socialista, do Partido Americano e do Boston Tea.Mais imediatamente, a era Bush chega ao fim, o que sempre deve ser saudado. Essa deve ser a alteração mais percebida, inclusive com o fim do conceito e da prática espúrios de "guerra preventiva" e de unilateralidade.Não alimentemos ilusões, porém. Obama é uma alternativa para o capitalismo norte-americano em crise hegemônica. Seu programa de modernização da infra-estrutura energética, de comunicação, da pesquisa científica e da educação, com ampliação das políticas sociais, encontra apoio em representantes do poder econômico americano, como Warnen Buffet. O candidato do Partido Democrata contou também com a adesão de republicanos como Colin Powell.Obama renovou já na campanha, sem dúvida. Aglutinou apoio dos progressistas pela imagem de um jovem negro, idealista e determinado, e tranqüilizava os moderados com seu discurso sereno e disciplinado. Desse modo, envolveu amplos setores formadores de opinião pública: estudantes, jovens intelectuais liberais e ativistas de diversas minorias, até então apáticas pela desilusão política. Conseguiu, pouco a pouco, um raro engajamento popular, por meio de mecanismos como a internet. E recebeu os aportes do grande capital, viabilizadores do acesso à propaganda e à mídia de massas.O setor mais conservador da sociedade norte-americana, que McCain representou, como porta-voz da moralidade individualista, desta vez não ganhou. Os desastres do governo Bush no Iraque e no Afeganistão e o agravamento da crise econômica desde o estouro da "bolha imobiliária" favoreceram Obama. A vice do Republicano, Sarah Palin, no seu arrebatamento ultraconservador, disparava contra Obama, ecoando a linha da campanha, classificando-o como "celebridade", "elitista", "terrorista" e "comunista". Isso por ter ele defendido aumentar em 4,5% a alíquota das rendas acima de U$ 250 mil, auferidas por apenas 2% da população, voltando aos níveis do governo ("socialista", sra. Sarah?) de Bill Clinton. A postura fundamentalista e reacionária acabou por angariar antipatia da maioria da população contra sua própria chapa.Para além do simbolismo da eleição de um descendente afro-americano para a Presidência dos EUA é imperioso refletir sobre os destinos da sociedade, do planeta e da humanidade: é grave a situação da Terra produzida pelo irrefreável aquecimento global. Como lembra Leonardo Boff,: "não basta dizer que o aquecimento é produzido pelo ser humano. Que ser humano? Pelos índios, pelos esquimós? Precisamos dizer com todas as letras: o aquecimento foi produzido por aquela porção de homens que introduziram a produção industrial já há três séculos, aceleraram o consumo energético, inventaram a tecno-ciência que agride ecossistemas (ecologia ambiental), indutora de uma perversa desigualdade social (ecologia social) e devastadora do planeta como um todo (ecologia integral) e projetaram a cultura do consumo ilimitado (ecologia mental). Hoje são corporações industriais globalizadas, gigantes da bioquímica, do agro-negócio e instituições afins. São eles que mais poluem (só os USA, 25%) e que mais resistem às mudanças paradigmáticas. Se eles não se alfabetizarem ecologicamente e não mudarem o rumo do mundo poderão levar a biosfera para um impasse desastroso""Change" foi a senha vitoriosa de Obama. Mudança para valer, em nível global, significa reconhecer que como está não dá mais para continuar. Estamos condenados a inventar um outro modo de conviver, produzir e distribuir os bens necessários, de consumir responsável e solidariamente e tratar, reaproveitando, os dejetos, os resíduos. Precisamos, como enfatiza a Carta da Terra, de "um modo sustentável de viver". O atual já revelou-se não mais sustentável para 2/3 da humanidade. Todas as alternativas energéticas e supostamente ecológicas não vão ao cerne da questão. Em três ou quatro anos vão mostrar sua ineficácia. Dir-se-á: "vocês foram alertados e sabiam, mas preferiram a cegueira voluntária e a nossa perdição para garantir a rota insensata que lhes dava vantagens". É preciso transformar o sistema produtivo e as relações de produção e convivência. Eco-socialismo ou barbárie!Mudar e revolucionar é urgente. Nós, conscientes e organizados, podemos.

*Chico Alencar é educador, escritor e deputado federal do PSol

Um comentário:

Barone disse...

Gosto do Chico Alencar. Foi meu vizinho no Rio de Janeiro, na Sabóia Lima, quando eu era apenas um molekote. Simpatizo mesmo. E também concordo com quase tudo que foi dito aqui. Mas, classificar Malcolm X com "líder negro grandioso" é dose para elefante. Malcon X pregava a total separação entre brancos e negros. Racista ao extremo. Que coisa bonita né? Cuidado com as palavras é fundamental. Sem isso corremos o risco de contaminarmos todo um raciocínio.